Como entender a retirada da pré-candidatura de Boulos?

Como entender a retirada da pre-candidatura de Boulos
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Guilherme Boulos anunciou que desistiu da sua pré-candidatura ao Governo de São Paulo. Pontuando entre 10% e 15% a depender do cenário, Boulos optou por ser candidato a deputado federal indicando a unificação do PSOL em torno da candidatura de Fernando Haddad. Por mais que tenha justificado a desistência com o argumento de focar no fortalecimento da bancada de deputados do PSOL no Congresso, o jogo aqui é muito mais profundo e sintomático da relação umbilical que Boulos e o PSOL nutrem com o PT atualmente.

Muito é dito sobre a aproximação do PSOL com o PT a partir de 2016, mas essa aproximação envolve uma estratégia de diálogo com o lulismo para sua superação pela esquerda. Por isso, fazia-se necessário o lançamento de candidaturas majoritárias para disputar esse espólio lulista, como foi feito com o próprio Boulos em 2018, um fiasco, e 2020, um sucesso, pelo menos se levarmos em consideração a estratégia do PSOL em se aproximar para disputar o lulismo. Nesse caso, tendo em vista a necessidade de uma candidatura majoritária para disputar o lulismo, o que pode significar o recuo de Boulos e sua candidatura a deputado federal?

A resposta a essa pergunta envolve não só os motivos de Boulos, mas a compreensão de uma mudança fundamental na estratégia do PSOL, o que indica a sua desistência em disputar o lulismo pela esquerda. Por que digo isso? O jogo do PSOL, depois de 2016, envolvia se aproximar do PT, mas mantendo suas candidaturas majoritárias para criar novas lideranças que dialogavam com a base lulista, resultando em aumento das bancadas nos legislativos e nos votos majoritários esperando uma renovação da esquerda que possibilitasse ao partido assumir um protagonismo maior do que tinham. Era uma estratégia arriscada (e equivocada, a meu ver), mas ainda era uma estratégia. O que vemos agora sequer é uma estratégia, apenas a rendição total à linha política do lulismo.

Como podemos afirmar isso? Simplesmente olhando para o momento em que essa desistência se deu e seus efeitos no cenário das pesquisas. Podem acreditar que é coincidência, mas Boulos desistiu justamente na semana seguinte a uma pesquisa da Quaest (geralmente mais favorável ao PT) que mostra Haddad com 24% e França com 18%, praticamente empatados. Nesse cenário, no embate entre França e Haddad para ver quem fica com a candidatura a governador pela aliança PT/PSB, França tinha um trunfo importante, que é sua baixa rejeição e penetração no eleitorado de direita. Com a desistência de Boulos, esse trunfo perde força, já que a grande maioria dos votos de Boulos migram para Haddad, desequilibrando o jogo nessa disputa. Basta observarmos a pesquisa Ideia Big Data que acaba de sair para entender que foi justamente isso que aconteceu. Boulos desiste e Haddad salta para 27% enquanto França fica com 14%, empatado com Tarcísio. É verdade que não podemos fazer uma comparação tão segura com pesquisas diferentes, mas podemos ver a tendência de crescimento de Haddad após a desistência de Boulos.

Juntando todas essas peças, começamos a entender o sentido da desistência de Boulos. Sua desistência atende exclusivamente à estratégia de Lula no cabo de guerra entre França e Haddad. Por quê? Vamos imaginar que Boulos desistiu exclusivamente para fortalecer a bancada do PSOL em Brasília. Qual é o cenário que melhor atende ao PSOL? 1) Boulos manter sua pré-candidatura até julho, sedimentar uma base importante, ocupar espaços na mídia como pré-candidato e, só depois disso, desistir com um capital político maior do que tem agora; 2) Boulos desistir em março e perder todo o espaço que uma pré-candidatura a governador tem no debate midiático? Parece meio óbvio, não? O que fez Boulos decidir por abandonar a pré-candidatura agora? Ao que tudo indica, Boulos abandona a corrida pelo Palácio dos Bandeirantes agora exclusivamente para dar algum percentual de votos a Haddad para forçar a retirada da candidatura de Márcio França, o que se confirma com a última pesquisa.

E agora? O que Boulos ganha com isso? Parece que o acordo envolve fortalecer Haddad agora para Boulos ser o candidato do lulismo em 2024, o que já foi indicado por Lula. Só esqueceram de convencer o eleitor paulista disso. Haddad tem chances reais de se eleger governador por São Paulo esse ano? E se ele perder a eleição? Onde fica o apoio a Boulos depois de Haddad ser derrotado no segundo turno em São Paulo e virar “a candidatura natural” para a Prefeitura de São Paulo em 2024? Quem conhece o histórico do PT com seus aliados deveria ficar com um pé atrás em relação a todas essas promessas. Boulos pode estar sacrificando o próprio partido nesse movimento.