O museu do atraso

O museu do atraso
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Por Juliana Brizola – Os acontecimentos ocorridos em Bento Gonçalves são o ponto de chegada de uma sociedade doente. Foram resgatados 207 trabalhadores que viviam à margem da humanidade, em situação análoga (no sentido mais estrito possível da palavra) à escravidão.

O ponto de partida deste enredo triste é a chaga do escravagismo, ainda presente no Brasil. Os senhores de hoje ainda não perderam o costume de seus antepassados – e o Estado não foi capaz de fazê-los se adequar à civilização.

As vinícolas correram para se eximir do ocorrido. No Brasil, empresários nunca têm culpa dos abusos dos quais se beneficiam, mesmo que suas margens de lucro sejam pagas com o suor da exploração.

Não bastasse o inacreditável, o dia nos reservava ainda o absurdo. O Centro da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves (CICBG), em nota criminosa atribui culpa à “larga parcela da população” que encontra-se “inativa, sobrevivendo de um sistema assistencialista que nada tem de salutar”. Sejamos diretos: a CICBG culpa o Bolsa Família pelos crimes ocorridos nos quintais que lhes serviam. Mostra-se que a visão da junta comercial é no mínimo complacente com o regime encontrado nas Serras de Bento Gonçalves.

Outro que não escondeu suas preferências foi o vereador Fantinel, de Caxias do Sul, na tribuna que deveria ser do povo, cometeu a atrocidade de culpabilizar a origem nordestina das vítimas pela monstruosidade a que foram submetidas. A fala envergonha o povo Gaúcho, que tanto contribuiu para a unificação de nosso país e que assistiu, em sua grande maioria, estarrecido ao vereador. Não podemos deixar que irracionalidades como estas manchem nossa história.

A justiça têm o dever de punir todos que se beneficiaram direta ou indiretamente de trabalho escravo. Não eximindo empresários que gozam das brechas na última reforma trabalhista para se desvencilhar de situações criminosas. A estes, a certeza de que não descansaremos até a certeza de que o passado seja apenas uma peça no museu do atraso.

Por Juliana Brizola