Em bom artigo na Folha, Delfim Netto pede “Um projeto de país, por favor”. É importante resgatar a ideia de projeto nacional, que, por definição, se contrapõe à ideologia mercadista hoje dominante. Mas penso que a raiz do nosso problema não é a falta de projeto, mas a falta de um sonho nacional, de um ideal de país, de uma visão civilizatória própria sobre nós mesmos. Sem valores superiores sobre nós mesmos, qualquer projeto será apenas uma tecnicalidade abstrata, pois o que dá substância e movimento a qualquer projeto é a força do sonho e do ideal.
Não à toa, o Brasil só conseguiu firmar um projeto de fato, e de forma muitíssimo bem sucedida, quando estava imbuído de um sonho e ideal de Brasil, criado na Era Vargas, quando o Brasil tinha a si próprio como país do futuro, orgulhosamente verde e amarelo, tropical, mestiço e reverente aos seus símbolos e heróis. O Brasil não mais se encontrou desde que foi adestrado por uma elite intelectual apátrida – e, aliás, por bastante tempo, predominantemente de esquerda, com a neodireita empatando hoje em dia – a renegar esse sonho e ideal, rotulado de “ufanismo”, como se ufanar-se da própria terra fosse “alienação” e criticar aberta e intransigentemente as próprias raízes fosse inteligência e pensamento crítico.
O esvaziamento do sentimento nacional resultou justamente na desorientação que vivemos hoje, na incapacidade de conceber qualquer expectativa além das mesquinharias eleitoreiras. Um país tão grande e tão rico, com riquezas muito superiores as que motivaram todas as guerras e imperialismos até hoje, mas sem ambição e consciência de si, completamente auto-abandonado, não pode sequer reclamar de estar sendo ocupado por outros países, pois, no plano da geopolítica, “achado não é roubado, quem perdeu foi relaxado”.