Major Policarpo e o Brasil de fato

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Policarpo Quaresma, no romance de Lima Barreto, é um brasileiro apaixonado. Não por uma esposa – ele não tinha, nem por sua família ou seu trabalho – não cultivava a menor fixação por eles. O Major era um apaixonado pelo Brasil.

Acreditava cegamente que nessa terra, tudo que se plantasse, dava. Que o nosso progresso seria alcançado pela substituição da língua lusa pelo tupiniquim. Que lutar de mão armada por nossa pátria traria glória à nação.

Quaresma era desses que viam no Brasil todas as virtudes de uma terra próspera.

Não estrago a leitura de ninguém ao dizer que toda essa empolgação não terminou bem. Triste fim.

Policarpo não foi o primeiro a cair nessa história. E nem o último.

A impressão que fica é que alguém inventou esse papo de que o Shangri La é aqui e passou a reproduzir, a ponto de todo mundo cair. Cá entre nós, essa é a nossa especialidade: levar gringo na lábia.

O X da questão é que essa papagaiada de Brasil-perfeição não enganou só eles. Enganou o Major. Enganou a nós também.

O Brasil de fato é este mesmo que Policarpo experimentou: a terra é seca e os interesses mesquinhos. O Brasil de fato é arroz, feijão e labuta – nada mais.

E não se enganem: sempre foi assim, ao menos desde que não mais habitado predominantemente pelos índios.

Mas se você perguntar a um brasileirista – como este que vos escreve – qual Brasil ele vê (leia: crê), a história será outra.

Estou convicto: somos alegres, festeiros e amorosos. Quentes. Felizes. A terra é boa e o ar é leve. O céu é lindo e as matas (ainda) abundantes. As águas são límpidas. O Carnaval…

Pensando bem, talvez o Brasil não seja tão brasileiro porque é. Mas por acreditarmos que é.

Talvez a essência de ser brasileiro esteja em se embriagar na própria lábia a ponto de realmente acreditar que o verde e amarelo de nossa bandeira vieram da mata e do ouro.

Bom, enquanto acreditarmos, estamos bem.

Com o triste fim de Quaresma, tiro a lição: o Brasil é maravilhoso, só não podemos querer tirar a prova dos noves.