A importância das comunicações pública e governamental para o trabalhismo

O papel das comunicações pública e governamental e a importância para o trabalhismo brizola globo
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Por Fernanda Buarque – Semana passada fez 23 anos do direito de resposta de Leonel Brizola à TV Globo. Lido ao vivo durante o Jornal Nacional, pelo apresentador Cid Moreira, poucos acontecimentos revelam o quanto os meios de comunicação são capazes de destruir reputações de figuras públicas como este evento. Felizmente neste caso o falecido governador pôde responder com um texto brilhante, típico de seu talento de exímio orador, defendendo-se das inverdades atribuídas às suas realizações no estado do Rio de Janeiro. A campanha sistemática contra o sambódromo, construído na sua primeira gestão, e hoje uma construção de importância inconteste para a projeção do carnaval carioca e da cultura brasileira, foi apenas um exemplo das desonestas matérias veiculadas pela Rede Globo contra Brizola.

Duas décadas mais tarde, o ex-presidente Luís Inácio da Silva, outra liderança do campo popular, também foi vítima de campanha sistemática contra seu nome e de seu partido. Campanha esta que contribuiu para o impeachment de sua sucessora, Dilma Rousseff, em 2016, bem como sua prisão, em 2018. Mais uma vez a Rede Globo teve papel central, junto com outras emissoras de TV e rádio e jornais, também responsáveis por viabilizar estes eventos, influenciando a audiência quanto aos supostos crimes cometidos pelos dois ex-presidentes.

Também na semana passada ocorreu outro fato relevante para o campo da mídia no Brasil: o anúncio do início de processo de privatização da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Criada em 2008, com o objetivo de promover a comunicação pública, a EBC absorveu a Radiobras – tendo sido esta fundada em 1976, e dedicada à comunicação governamental – , além de veículos como a Rádio MEC e as Televisões Educativas do Maranhão e do Rio de Janeiro, então administrada pela Organização Social Associação de Comunicação Roquette Pinto.

Apesar de ter sido idealizada e instituída pela gestão petista visando atender a uma premissa constitucional, promover a comunicação pública complementando as comunicações estatal e privada, a empresa foi frequentemente utilizada de modo pouco claro quanto às diferentes funções das modalidades estatal e pública. Sendo assim, quando se iniciou o processo midiático de desconstrução das figuras políticas de Lula e Dilma, e de seus companheiros de partido, também as empresas estatais, particularmente a EBC, sofreram com a associação a supostas práticas de corrupção e de beneficiamento do funcionalismo público. Além disso, embora a empresa conte com vários veículos de comunicação, duas televisões, oito rádios, dois sites de notícias, muitos a associam apenas à

TV Brasil. Esta ganhou, aliás, o apelido pejorativo de “TV Lula”, o que aponta para o uso governamental que, muitas vezes, foi feito deste veículo.

Vale ressaltar que o artigo 223 da Constituição Federal prevê a complementaridade dos sistemas público, privado e estatal. Do ponto de vista de cidadania, a comunicação pública é fundamental para divulgação de conteúdos de caráter jornalístico, educativo e cultural. Estes não devem se basear em preocupações comerciais, típicas de emissoras privadas, e nem governistas, já que sua finalidade independe das posições políticas de determinados governos.

Por sua vez, a comunicação estatal tem grande relevância pois permite que as realizações e a visão política dos governos vigentes cheguem à população. É necessário que a audiência não seja refém de narrativas impostas pelos veículos comerciais, que, dependendo de seus interesses, podem construir e destruir governantes e demais lideranças políticas.

Diante do quadro político e das premissas constitucionais, é preciso que o campo progressista e, principalmente, os trabalhistas tracem estratégias para o setor da comunicação que garantam de forma eficaz tanto a promoção da comunicação pública, finalidade da EBC, quanto da comunicação estatal, finalidade da extinta Radiobras.

Cabe lembrar que a Rádio Nacional, que existe até hoje, e que foi absorvida pelo sistema EBC, foi vital para a comunicação entre o presidente Getúlio Vargas e os brasileiros. Resguardadas as diferenças dos contextos históricos, é notório verificar o potencial que o veículo representou para a radiodifusão nacional. A lição varguista para o campo da comunicação precisa ser retomada de forma que haja garantia da defesa de nossa soberania e que governos futuros não se vejam ao sabor dos interesses da mídia comercial.

Nesse sentido, acredito que os trabalhistas devem entender a importância estratégica que um sistema de comunicação como o da EBC, bem como o da extinta Radiobras, representam. Urge que os militantes do trabalhismo avancem na compreensão da defesa e garantia dos preceitos da comunicação presentes em nossa Carta Magna, de forma a assegurar a democracia e propiciar o desenvolvimento nacional.

Por Fernanda Buarque. Pesquisadora da EBC, mestre e doutoranda profissional em História Política e Bens Culturais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC/FGV).