Ciro Gomes e o encontro Lula-FHC

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Por H. Raphael de Carvalho – Enviei para os meus amigos o artigo intitulado “Por que Ciro desperta tanto ódio nos lulistas” de Luiz Carlos de Oliveira e Silva. Reações diversas. Muitas confirmando a hipótese levantada por Luiz Carlos. Dois amigos responderam com mais profundidade e discorreram sobre as questões suscitadas pelo artigo. Aqui reproduzo os apontamentos sobre suas respostas. Um primeiro, um dos nossos maiores especialistas em estratégia destaca o espaço dado a foto “histórica” do encontro entre Lula e FHC e aponta o porquê da ausência de Ciro. O outro, jornalista, escritor, ex-líder estudantil e sindical, se identifica como ferrenho defensor da formação de uma frente amplíssima para derrotar Bolsonaro “pois acho que se engana quem pensa que ele está fraco” e deixando claro que “apoiarei Lula de novo com fervor no segundo turno” critica a postura dos lulistas que criticaram as iniciativas frentistas anteriores e agora aplaudem quando Lula propõe. “Isso é seguidismo”, disse.

Comecemos pelo nosso estrategista. Para ele existe uma legenda não escrita na “foto histórica”. Tanto FHC quanto Lula são defensores da “luta contra o fascismo” dentro do figurino preconizado pela “Faria Lima não bolsonarista” que quer se livrar dos maus modos do capitão e sua turma mas não deseja que se altere a agenda neoliberal. A ausência de Ciro Gomes na “foto histórica” se explicaria por esse segundo quesito.

A ausência de Ciro Gomes na “foto histórica” seria tão eloquente quanto as presenças de Lula e FHC. Ele ficou de fora porque bate tanto em Bolsonaro quanto na agenda de desmanche do Estado Nacional promovida pelo neoliberalismo.

O pré-candidato do PDT tem deixado claro que existem três tarefas fundamentais: derrotar Bolsonaro e as políticas por ele representadas, barrar a agenda neoliberal e reconstruir o país. Tanto Lula quanto FHC só aceitam encampar a primeira dessas tarefas. Por isso estão juntos na foto e por isso Ciro está de fora.

Meu amigo, e eu concordo, é de opinião que a dupla Lula e FHC (os dois grandes nomes do petucanismo) são os responsáveis pela demolição do Estado Nacional. Não por acaso ambos em momentos diferentes se atribuíram a tarefa de destruir o legado getulista. Sobre isso ele destaca o fato de tanto Lula quanto FHC serem produtos da classe hegemônica de São Paulo “que sempre teve como objetivo se vingar de 1932 e que hoje vive do rentismo como vivia no passado do café.”

Dito isto meu amigo, a quem reputo uma das melhores cabeças do Brasil atual, critica posturas táticas de Ciro Gomes. Afirma que o ex-ministro deveria se concentrar no combate a Bolsonaro. “Centrar fogo no Bolsonaro enfraquece mais o Lula hoje do que o atacar. Ciro não pode continuar desconhecendo isso”. Segundo sua posição, Ciro não precisa e nem deve elogiar Lula. Mas o momento de demonstrar que Lula é um produto, assim como FHC, do mesmo projeto de destruição do Brasil virá em seguida. A não execução dessa tática confirmaria que Ciro Gomes não consegue entender o papel da estratégia na construção de um projeto político. Isso explicaria suas sucessivas derrotas eleitorais no plano nacional.

Meu segundo amigo preferiu comentar o que considera a “a puta contradição entre os seguidores acríticos de Lula, que seguem o que ele ordena de maneira cega e sem questionamento mínimo”.

Para ele, o lançamento da candidatura Haddad, “decidida como foi, sem convenção, com Lula preso há meses, decidindo sozinho se o PT teria candidato ou se seria vice do Ciro, depois quem seria o candidato e finalmente a partir de quando, com todo o partido aguardando sua ordem, é só um exemplo”.

Esse quadro se repete em 2020 e 2021 com a ideia da frente. Enquanto Lula se comportava como um crítico da ideia de frente, seus seguidores se mostravam radicalmente contrários. Como papagaios repetiam as críticas do líder, dizendo de frente ampla incluía inimigos dos trabalhadores etc. Agora, quando Lula se propõe a liderar “uma frente alargadíssima com inimigos ainda mais claros dos trabalhadores – todos (os mesmos) batem palmas, brindam e saúdam”.

Essa contradição dos que antes criticavam, sob a liderança de Lula, “uma iniciativa e agora aplaudem uma semelhante que incorpora ainda mais o conteúdo da crítica então feita, no meu tempo de movimento estudantil se chamava “seguidismo”, termo aplicado aos que seguiam cegamente as ordens do Comitê Central de sua organização” concluiu acrescentando que deixou duas organizações de esquerda por se recusar a ter essa postura acrítica.

Creio que meus apontamentos sobre opiniões de amigos que considero poder dar grande contribuição ao necessário debate reforçam a hipótese levantada por Luiz Carlos de Oliveira e Silva, por um lado, e por outro (particularmente no tocante a estratégia cirista) trazem uma reflexão para o candidato melhor apetrechado para quebrar a continuidade petucana no momento da derrocada da direita raivosa.

Por: H. Raphael de Carvalho.
Professor colaborador e Pesquisador associado do Inst. de Estudos Estratégicos (INEST/UFF). Mestre em Política pela PUC/RJ e Doutor em Ciência Política pela UFF.