Por Lucas Rubio – Há 41 anos, em 2 de abril de 1982, tinha início a Operação Rosário, o plano de retomada de soberania das Ilhas Malvinas pela Argentina.
As Ilhas Malvinas são um conjunto de ilhas localizada na costa da Argentina no Atlântico Sul. As ilhas foram sequestradas e ocupadas pelo Reino Unido no começo do século XIX. Mesmo sob protesto por parte do governo argentino e do praticamente consenso mundial de que se trata de uma invasão, o Reino Unido nunca demonstrou qualquer movimentação na direção de resolver a questão.
Em 1982, o governo argentino, na época uma ditadura militar ferrenha sob o poder do ditador general Leopoldo Galtieri, resolveu invadir as Ilhas Malvinas. O objetivo central, que pode parecer nobre à primeira vista, não tinha nada de justo: a Junta Militar procurava desesperadamente uma maneira de atenuar a crise aguda de imagem e prestígio que a ditadura passava e desviar o foco das críticas evocando o patriotismo da questão das Malvinas. Péssimo desempenho econômico, inflação, corrupção estrutural, pobreza, desemprego e um caos social regado à repressão violenta tentaram ser resolvidos com uma guerra.
A ditadura de Leopoldo Galtieri calculou que uma invasão às Malvinas seria um sucesso rápido e fácil. Foi estimado que as ilhas contavam com pouco contingente de defesa, que as tropas britânicas não estavam bem munidas, que a metrópole demoraria demais para responder em larga escala por conta da distância (Londres está a 13.000 km das Malvinas) e que outros conflitos desviariam o foco. Durante semanas antes da invasão, armamentos foram comprados do mundo todo e embarcados para Buenos Aires em aviões civis disfarçados. Vale lembrar que até o Reino Unido, que tinha ótima relação de apoio à ditadura, chegou a fornecer munições.
Na madrugada de 2 de abril de 1982, após um breve período de penetrações fortuitas ao território das ilhas vizinhas, um grande número de tropas argentinas começou uma invasão anfíbia às ilhas. Os poucos britânicos armados na ilha são pegos de surpresa. Na infrutífera tentativa de montar trincheiras para defender Porto Stanley (Porto Argentino), a capital, dezenas de ingleses são feitos prisioneiros ou mortos em combate.
Em menos de 24 horas, a bandeira da Argentina tremulava gloriosamente pelas Malvinas. A ditadura militar usou as imagens à exaustão para declarar vitória final. Os nomes locais foram rapidamente trocados para o espanhol e a população civil foi respeitada. A cena de ingleses rendidos jogados no chão e sendo fotografados por argentinos apavorou a opinião pública britânica. Chocada, a sociedade civil rapidamente pressionou o governo do país, na época chefiado por Margaret Tatcher.
Tatcher, pega de surpresa em plena campanha eleitoral, sofrendo uma baixa de popularidade por conta de suas medidas draconianas neoliberais de arrocho salarial e corte massivo de direitos sociais e uma das maiores entusiastas e patrocinadoras de ditaduras militares de direita no mundo, sofreu pesada pressão pública para tomada de ações. Conclamou seus aliados internacionais a isolarem a Argentina e acionou as forças armadas, que improvisaram de última hora um plano militar de recuperação da possessão colonial das Malvinas.
A Operação Corporate teve início uma semana depois da recuperação argentina das ilhas e durou até meados de junho de 1982. O Reino Unido, notável potência naval, mobilizou suas forças aeronavais rumo às Malvinas. Até mesmo forças nucleares foram acionadas. Os britânicos também conseguiram os segredos para desativar as armas argentinas, que eram fornecidas por países aliados dos ingleses. Com uma força paradoxalmente descomunal e desajeitada por conta do calor dos acontecimentos, os britânicos bombardearam as Malvinas e se envolveram em batalhas navais e aéreas contra os argentinos, que, com muita deficiência, perderam muitos equipamentos e vidas.
No meio de tudo isso, um incidente diplomático curioso: um avião bombardeiro estratégico britânico Vulcan sofreu problemas técnicos e não conseguiu ser reabastecido durante o voo, tendo de pedir desesperadamente para pousar no Rio de Janeiro. O governo brasileiro permitiu, mas reteve a aeronave e só a devolveu para os ingleses muito tempo depois após apelos diplomáticos, mas sem os armamentos, num gesto de apoio à aventura argentina (o Brasil vivia os últimos anos do regime militar).
Durante as semanas de batalhas em ar, terra e mar, ambos os lados perderam vários soldados e equipamentos. Foram várias aeronaves, navios de guerra, helicópteros e outros equipamentos perdidos. Do lado argentino, notabilizou-se a perda do Cruzador General Belgran, ao passo que a perda do Destróier HMS Sheffield foi uma simbólica perda britânica.
Em 14 de junho de 1982, após 2 meses de guerra, as Malvinas estavam nas mãos dos britânicos.
Nesta guerra, morreram quase 650 militares argentinos. As baixas britânicas somam mais de 250, mas há suspeita de atenuação dos números por parte da oficialidade inglesa. Além disso, as perdas materiais foram imensas: 34 aeronaves abatidas e quase 30 navios afundados ou destruídos.
Na Argentina, a derrota significou a queda da ditadura militar. O general Leopoldo Galtieri renunciou horas depois da declaração de derrota. A ala militar, que por anos tutelou a política argentina, ficou seriamente sob suspeita e desgaste de imagem.
No Reino Unido, significou a vitória de Margaret Tatcher nas eleições com recorde de votos, se mantendo no poder até a década de 1990, apesar do tom megalomaníaco que beirou um massacre nuclear que ela adotou durante o conflito.
As Malvinas ganharam um massivo investimento financeiro e estrutural no pós-guerra e passou a ter status político de autonomia ainda mais elevado na comunidade colonial britânica. A presença militar inglesa aumentou significativamente, representando um perigo ainda maior para os países do Atlântico Sul, agora ainda mais amarrado por Londres.
A questão das Malvinas segue totalmente viva na sociedade argentina de hoje e é praticamente um “pecado” dizer que as ilhas não são argentinas. Em 2022, durante uma viagem para Buenos Aires, o autor deste texto testemunhou adesivos em transportes públicos dizendo “as Malvinas são argentinas!”. Apesar disso, os argentinos entendem que a ação militar foi desastrosa e uma decisão unilateral da ditadura.
Por Lucas Rubio