O triste fim do PSDB

O triste fim do PSDB
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Pela primeira vez, em 28 anos, um candidato do PSDB não disputará o segundo turno em São Paulo.

Rodrigo Garcia somou 4.296.293 votos, ou seja, 18,40% dos votos válidos, perdendo a disputa para Tarcísio de Freitas, o carioca, ex-ministro de Bolsonaro e para Fernando Haddad, do PT.

Ao longo dos anos, os tucanos vêm derretendo no principal estado do Brasil.

Vamos aos números:

• Em 1994 Covas venceu o primeiro turno com 6.574.517 votos, ou seja, 48,84% dos votos válidos.

• Em 1998, Covas foi ao segundo turno colo segundo colocado, perdendo o primeiro turno para Paulo Maluf. Em primeiro turno recebeu 3.813.186 votos, ou 22,95% dos válidos. Virou a eleição de forma espetacular, terminando o segundo turno com 9.800.253 votos, equivalente a 55,37%.

• Em 2002, Alckmin, sucessor eleitoral de Covas, venceu o primeiro turno com 7.505.486 votos, equivalentes a 38,28%

• Em 2006, José Serra venceu já em primeiro turno com 12.381.038 votos, ou 57,93% dos votos válidos.

• Em 2010, no retorno de Geraldo Alckmin, o partido angariou 11.519.314 votos, elegendo-se no primeiro turno com 50,63% dos votos válidos.

• Em 2014, o mesmo Geraldo Alckmin conquistou 12.230.807 votos vencendo a disputa pela reeleição ainda em primeiro turno com 57,31% dos votos válidos.

• Em 2018, o outsider João Dória garantiu 6.431.555 votos para o partido, terminando a primeira etapa com 31,77% dos votos.

Em média, nas últimas sete eleições estaduais, os tucanos obtiveram cerca de 8,6 milhões votos em primeiro turno. Esse era o padrão. Abertas as urnas em 2022, os tucanos viram-se derrotados somando pouco mais de 4 milhões de votos. Uma diferença negativa cerca de 4,6 milhões em relação à média histórica, e de 2.135.262 votos em relação a 2018, isto é, quase 1/3.

Rodrigo Garcia, como um menino mimado, deixou de se pronunciar publicamente, sequer agradeceu os votos; postou apenas algumas linhas nas redes sociais. Não deu as caras, trancou-se no Palácio dos Bandeirantes.

Não bastasse a derrota, buscou a humilhação.

Menos de 48 horas depois, sem consultar a direção do partido, partidos coligados ou mesmo seus próprios secretários, resolveu correr de braços abertos para Bolsonaro e declarar “apoio incondicional” tanto ao presidente fascista quanto ao seu ex-ministro Tarcísio de Freitas… tudo para “o PT não vencer no estado”.

Deu com os burros n’água!

Tarcísio de Freitas desprezou o apoio e declarou publicamente que não fazia sentido ter Rodrigo em seu palanque.

Triste fim do PSDB. Derrotado e humilhado!

De fala mole, cabelo bem penteado, sorriso suave, óculos semi-transparente, Garcia foi a síntese do próprio partido. Oriundo do antigo PFL, Rodrigo Garcia, vice de João Dória representou bem a alma tucana:

Com cara de bom moço, garoto criado a leite com pêra, Rodrigo tucanou a campanha. Escondeu Dória, posou de “isentão” com o slogan “nem direita, nem esquerda”. Cheio de declarações inócuas, evitando ser direto e objetivo, reprisou o mesmo discurso de Geraldo Alckmin, José Serra, Bruno Covas e João Dória, ou seja, “Poupatempo, Bom Prato, Rodoanel… ETEC’s, não fale mal de São Paulo…” essas coisas.

Dessa vez não colou.

Que o PSDB morreu, isso já faz tempo. Morreu com Covas ainda em 2001. Covas foi o último socialdemocrata de renome no PSDB. O que vimos esse último domingo foi só a missa de sétimo dia, nada mais.

Rodrigo foi a síntese desse fim: oriundo do malufismo, trabalhou com Celso Pitta, o pior prefeito da história de São Paulo. Com Gilberto Kassab, manteve relação de longa data. Décadas atrás, os carros de som das campanhas entoavam o enjoativo jingle: “quem sabe, sabe, vota comigo federal é Kassab, estadual é Rodrigo”.

Vice de Dória, trocou a frente liberal pelo PSDB para manter a dinastia tucana no estado. Fracassou. E o fim não poderia ser mais simbólico: Rodrigo, o “bom moço” de direita, que trabalhou nos bastidores do tucanismo, não apenas foi mal votado, como emporcalhou de vez a história do partido.

Em 1998, Covas recebeu o apoio do PT contra a direita corrupta representada por Maluf. Em 2000 devolveu o apoio ao PT, fazendo campanha para Marta Suplicy vencer a prefeitura de São Paulo no segundo turno.

Em seu discurso de posse para o segundo mandato, em 1999, Covas bradou contra a política econômica do presidente Fernando Henrique Cardoso, seu companheiro de partido. Entendia, na época, que a política rentista atacava o capital produtivo e enfiava o país no atoleiro do desemprego e da crise social.

Esse PSDB de larga consciência social morreu. Faz tempo.

O que o partido colhe hoje é fruto de um amplo processo de degradação, perda de identidade socialdemocrata e de alianças realizadas com a direita.

No longínquo ano de 2004, setores extremistas e antipetistas escondidos na campanha de José Serra à prefeitura de São Paulo, penduravam faixas anônimas contra Marta Suplicy com os dizeres “Marta, lugar de mulher é na cozinha”. Em 2008 numa campanha violenta contra Marta e a favor de Kassab, veiculou-se forte campanha anti-aborto, ligando a candidata do PT à defesa do aborto. Em 2010, setores da extrema direita, como a Opus Dei e a TFP embarcaram na campanha de Serra para presidente e Alckmin governador, de forma despudorada, a ponto de se distribuir santinhos nas portas das igrejas com imagens de Jesus Cristo de um lado e o número do partido de outro. Isso sem mencionar as inúmeras fakenews espalhadas contra Dilma Rousseff, associando sua imagem com o “terrorismo” e com o “fechamento de igrejas”

Não se ouviu um pio dos principais tucanos a respeito. Bicos calados, enquanto a direita expandia seus tentáculos por dentro do partido.

Em 2011, o partido recebeu festivamente a filiação de Coronel Telhada, figura da extrema direita ligado à sangrenta ROTA, além, claro de uma dúzia de outros coronéis. Ricardo Salles, o ministro de Bolsonaro que defendeu “passar a boiada”, isto é, desmatar a floresta sem constrangimentos, foi secretário de Geraldo Alckmin no governo de São Paulo.

O próprio João Dória, que foi governador, era da turma de José Sarney.

A gota d’água, porém, se deu em 2014 quando Aécio Neves, alucinado, tentou de todas as formas descredibilizar as eleições, não reconhecendo sua derrota para Dilma (PT), pedindo inclusive a auditoria das urnas eletrônicas – a semente do golpismo de Bolsonaro.

Esse foi um ponto de virada.

A partir daí, o PSDB desceu a ladeira sem freios. Veio o apoio descarado ao golpe parlamentar de 2016, o fortalecimento das manifestações de rua ao lado da extrema direita em 2015-2016, os escândalos da JBS em 2017, a divulgação do áudio em que Aécio ameaça de morte um adversário político, o apoio ao antipopular governo Michel Temer, e o apoio às pautas conservadoras de Jair Bolsonaro no Congresso Nacional.

Importante frisar que em agosto de 2021 nada menos do que 44% dos deputados federais do PSDB em plenário votaram a favor do projeto bolsonarista de emenda constitucional em prol do voto impresso!

Não é de admirar que em pleno 2022, Rodrigo Maia tenha declarado que o PSDB precisa ser um partido de centro-direita.
FHC encontra-se em idade avançada. José Serra, ao que consta, enfrenta enfermidades e não se elegeu deputado em 2022. Geraldo Alckmin saiu do partido e tornou-se candidato a vice de Lula. Bruno Covas, infelizmente, faleceu, deixando um vácuo de poder. A velha guarda brigou com Dória, mas foi incapaz de enfrenta-lo internamente.

É óbvio que um partido não desaparece totalmente de cena do dia para a noite. O PSDB foi engolido pelo bolsonarismo porque com ele estava casado no submundo da política já há bastante tempo. Todavia, o PSDB histórico, de Franco Montoro, Bresser Pereira, Covas, Jereissati, FHC, Teotônio Vilela, Pimenta da Veiga, etc. esse sim, infelizmente jamais retornará.

Pelo que se vê sobrou mesmo o PSDB de João Dória, dos coronéis da vida e de Rodrigo Garcia, puxadinho do bolsonarismo, aliançado com a extrema-direita, bem longe de qualquer resquício de socialdemocracia.

Pelo histórico dessa turma, eles tentarão algum carguinho num hipotético governo Tarcísio Freitas…

Assim como Rodrigo Garcia, o PSDB entrou pequeno nas eleições de 2022 e saiu nanico. Satélite do extremismo, com a menor bancada de sua história, sem governadores de peso, sem acesso à boa fatia de verba do fundo eleitoral e com tempo de TV reduzido… ao que tudo indica, o PSDB além de morto, entrou em estado de decomposição.

Sente-se o mau-cheiro nos corredores do Palácio dos Bandeirantes.

Triste, mas merecido fim.

  1. Digo como alguém que não é paulista, que sinceramente cabe uma reflexão sobre a ascensão e queda do PSDB. É de se pensar como um partido que surgiu pensando – se em se colocar como uma alternativa ao antagonismo PFL/PT e ser uma terceira via se degenerou sendo absorvido pelo PFL, ter se tornado um partido de direita e no final de tudo, degenerado e engolido pelo bolsonarismo.

    Tivéssemos uma vida acadêmica e uma ciência política menos preguiçosa, menos pernóstica e colonizada, isso daria um baita de um estudo de compreensão do quanto uma capilaridade partidária pode ser construída, mas também perdida.

    É inacreditável como um partido que chegou a ter 6 governadores e nisso governando ininterruptamente um lugar tão heterogêneo e cheio de superlativos como São Paulo tenha chegado a esse ponto, e talvez tenha sido a sua fraqueza.

    O PSDB no meu entender se degenera pois nunca criou uma linguagem plenamente brasileira, nunca se preocupou ou se acomodou nos paradigmas do Brasil no fim da ditadura miltar e de todo o século XX, que foi a centralização do pensar, ser, existir e sentir o Brasil a partir de uma realidade paulistocêntrica, Uspiana e Unicampista. É um erro por exemplo que seu irmão siamês, o PT, não cometeu: quadros como Jacques Wagner, Camilo Santana, Fátima Bezerra, Marcelo Deda, Mercadante, Palocci, todas essas figuras, independente do que for, são figuras construídas e possuem capilaridade e organicidade não só com o aparato paulista (não esqueçamos que a cúpula do PT está em São Paulo e o liberalismo de esquerda emanado do PT parte da mesma fonte acadêmica e teórica da USP/UNICAMP, que abastece o PSDB igualmente), mas são personagens que entranharam, viveram a vida pública de suas paróquias, tendo para si o discurso do bem estar social, o confronto aos poderes estabelecidos.

    No PSDB, sinceramente, não vejo e nunca vi dessa forma. O PSDB sempre foi a cara, a voz e a boca do rentismo e da plutocracia, fazendo hoje o que o Partido NOVO hoje penso eu já monopoliza. Poderiam ter quadros fossem quais fossem, no final todos os caminhos e as rezas levariam para a Meca tucana, São Paulo. E era o caso de saber das fofocas desses bastidores paulistas, onde me parece que era norteado por Serra e Alckmin, que se odiavam, mas tinham um pacto bom para ambas as partes.

    Aécio Neves, que considero um dos maiores responsáveis por tudo que nosso país vive hoje – no mínimo culpa grave – veio para furar a fila e romper o comadrio ali existente e no seu afã de ser presidente da República, não só atropelou Aécio e Alckmin, como me parece ter rompido o partido e causado a discórdia e no resultado que teve contra Dilma, quis chamar para si a condição de figura da oposição pelo desempenho em 2014.

    Bancou ou pelo menos deu início ao golpismo de 2016 achando que ficaria por cima, mas depois foi chutado por esse processo todo e saindo de um jeito que teve muita sorte e certamente o natal de família não foi mais o mesmo diante da ideia de botar o próprio primo como laranja para depois queimar o arquivo.

    Nesse vácuo de caciques do PSDB, Dória foi apadrinhado por Alckmin na ideia de renovar o PSDB, mas o remendo velho em vestido ainda mais velho e é claro que nada disso poderia acabar bem. Figuras como Alberto Goldman e Simão Jatene e o próprio Alckmin vendo a cobra que criou e lhe picou também passaram a não aceitar um penetra de festa e puxa saco chegar metendo o pé na porta e dando ordens à casa. Depois, foi a barrada de Doria no baile e essa tragédia com ares de comédia que o PSDB vive. Cavaram um buraco fundo para colocarem os outros, mas nisso o PSDB cavou o buraco para fazer armadilha, terminando eles próprios a serem vítimas disso.

    Vá e que o diabo o carregue! Não faz falta em nada à vida pública.

  2. Seria bacana se pudessem postar meu comentário aqui. É impressão minha ou há alguma espécie de censura ou triagem para o que pode ou não ser postado aqui?

  3. O PSDB se afunda pois nunca foi de fato um partido brasileiro. Era sim, um partido paulista, e nos hegemonismos já bem conhecidos de São Paulo para com o Brasil, bem fluente no seu paulistês, afogou – se nas brigas internas, na alienação para com a realidade e onde o único programa e análise da questão nacional era uma versão moderada de Partido Republicano, ora um liberalismo de República Velha, numa mistura de liberalismo paulista da Contra Revolução de 32 com UDN e num máximo de atualização, Tatcherismo mofado.

    Perdeu – se na ideia de que a partir de São Paulo seus quadros teriam capilaridade nacional e futuras lideranças de outras praças, que poderiam oxigenar o partido foram postos para trás ou simplesmente foram desconsideradas. A outra coisa que a ser considerada no meu entender, foi como Aécio se construiu liderança no PSDB. Tratorando o pacto entre Serra/Alckmin, ficou ferido no ego quando perdeu para Dilma em 14 e no seu afã de mau perdedor, colocou em questão a confiabilidade das urnas, porteira essa que abriu, mas foi atropelado pela extrema direita que se antes estava represada no PSDB ou escondida nos clubes militares e viúvas de militares da vida, saiu do esgoto com toda a força que um cano de esgoto estourado pode ter em força de pressão. Pessoalmente considero Aécio um dos grandes catalisadores e impulsionadores da desmoralização que o Executivo vive hoje e todo o ambiente de chicana, desmoralização e desarmonia entre os poderes, e no mínimo com culpa grave!

    O PSDB afunda – se por ter se esvaído nos seus propósitos e na perniciosidade que escolheu. Que vá, e que o diabo o carregue!

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