A Igreja Católica foi fundada por Constantino?

A Igreja Catolica foi fundada por Constantino
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As crenças evangélicas precisam, muitas vezes, sustentar que a Igreja entrou em um período de cativeiro ou obscuridade ou desvio quando o Império Romano se tornou cristão durante o século IV.

Em alguns meios se tornou comum a ideia de que os 1260 anos de Reinado do Anticristo correspondiam ao tempo decorrido entre a união com o poder romano e o período das Reformas Religiosas na Europa.

Também não é por acaso que muitos protestantes e evangélicos sustentem que a “Igreja Católica foi fundada por Constantino” e que a partir de então uma série de crenças ”pagãs” entrou na Igreja, sendo o exemplo mais comum a devoção aos santos e a devoção à Mãe de Deus, além da rígida hierarquia eclesiástica e os aspectos litúrgicos mais formais.

O grande problema para eles é que essas narrativas não têm o mínimo sentido quando comparadas simplesmente aos dados da História. Estamos hoje em dia muito distantes das noções do século XIX, que pareciam referendar a percepção protestante e evangélica. O conhecimento histórico desenvolvido no último século colocou em xeque todas estas alegações, quando não as refutou inteiramente.

É possível perceber o apego a uma forte hierarquia eclesiástica na Igreja da virada do século I para o II. Alguns evangelhos ”apócrifos” do primeiro terço do século II [e que seguramente compilavam tradições mais antigas] demonstram a veneração e o status crescente à Virgem Maria: o Proto-Evangelho de São Tiago [também chamado de Evangelho da Infância de São Tiago] e o[s] Evangelhos[s] dos Hebreus apontam isso de modo incontestável. Pior ainda para protestantes e evangélicos, ambas as obras se desenvolveram em comunidades marcadamente judaicas.

De modo similar, culto às relíquias e imagens de culto são encontradas pela arqueologia em ocupações cristãs que remontam ao século III.

As rupturas ocorridas na Igreja com a cristianização oficial do Império no século IV não parecem muito com o protestantismo e com os evangélicos: eram teologias subordinacionistas [a mais famosa delas foi o arianismo] e de caráter gnóstico. A heterodoxia que mais se assemelha a aspectos da sensibilidade evangélica atual, o Montanismo, era mal visto por parte considerável do clero desde o século II, muito antes, portanto, da união com o poder romano. Além disso, a maior parte dos protestantes e evangélicos, até que de modo meio paradoxal, aceitam as decisões dos primeiros Concílios Ecumênicos.

De modo que, a ideia de uma “Igreja primitiva” distinta daquela que se desenvolveu sob obediência dos Bispos cuja legitimidade repousava na sucessão apostólica parece ser, antes de qualquer coisa, nada mais que uma fábula, uma invenção que se estabeleceu no século XVI, ganhou status de conhecimento comprovado durante os séculos XVIII e XIX, mas que foi amplamente refutado depois disso.