Vladimir Safatle, o ‘espontâneo’ e o ‘descentralizado’

jones manoel Vladimir Safatle, o espontaneo e o descentralizado
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Tenho muito respeito pela produção teórica de Vladimir Safatle. Já dividimos vários espaços de debate e é sempre um prazer dialogar com ele. Dito isso, foi mais que incômodo no escrito de Safatle “Uma revolução molecular assombra a América Latina”, a exclusão do Partido Comunista do Chile. Safatle fala de uma institucionalização da insurreição como se ele tivesse surgido do nada, exaltando a “não centralização”.

Duas coisas precisam ser ditas.

A ausência de protagonismo de partidos políticos não significa ausência de centralização – não necessariamente. O MTST e o MST, por exemplo, são movimentos sociais, não partidos, e tem direção política centralizadas (e vários aspectos do que seria um centralismo-democrático). Redes de coletivos e movimentos também têm níveis variados de centralização e cadeia de comando. Eu não conheço, por exemplo, a forma institucional de organização dos movimentos feministas no Chile. Não sei se existe uma federação, comando unificado de luta ou algo assim. Essa descentralização precisa ser demonstrada.

Em segundo lugar, o destaque da assembleia constituinte foi a eleição dos “independentes” e o resultado do Partido Comunista. O PC do país, inclusive, apanhou muito quando buscou dar uma forma institucional para a rebeldia, pautando a assembleia constituinte soberana. O que parece totalmente espontâneo no escrito de Safatle, passou por ação organizada, debatida e planejada de organizações – passou também!

De resto, me incomoda muito a citação a “Primavera Árabe”, ainda em bloco sem diferenciar, por exemplo, o processo da Tunísia com o do Líbia, e a ausência de um balanço disso – a Líbia, o país de maior IDH da África, foi destruído; e a Síria quase virou uma ex-nação.

Em suma, é preciso cuidado na hora de ver o “espontâneo” e o “descentralizado” nas lutas políticas.