Por Carlos Brasileiro – Ontem (12), aconteceu a diplomação de Lula, que governará o Brasil pela 3ª vez. O evento, ocorrido no TSE, foi marcado pelo belo discurso do presidente eleito, que, emocionado, falou sobre ter obtido mais uma vitória eleitoral, mesmo depois de ter sua vida absolutamente devassada.
Ora, a perseguição política sofrida por quem tomará posse em 1º de janeiro com certeza é uma das maiores fraudes jurídicas e midiáticas já inventadas pela elite brasileira. Não é preciso gostar de Lula para atestar isso.
O caso de lawfare, protagonizado pelo ex-juiz Sérgio Moro e pelo Ministério Público, no seio da Operação-Lava Jato, é mais um episódio da história do nosso país que demonstra que a classe dominante não gosta nem de quem concilia.
Por coisa semelhante passou Getúlio Vargas, antes de amargar o suicídio como última arma contra uma direita anti-povo e entreguista. Jango morreu no exílio, sem ter a chance de – uma vez deposto da presidência da república – retornar ao país que amava.
Me entristece assistir a gente que, amargurada, se recusa a reconhecer a grandeza de outrem em nome do próprio ego e do próprio interesse.
É preciso aceitar que o povo brasileiro deu a Lula uma expressiva vitória eleitoral, em um cenário desfavorável e com todo o aparato estatal operando contra desde meses antes da eleição – com benesses relacionadas ao Auxílio Brasil, empréstimos consignados, diminuição do preço dos combustíveis – até o próprio dia do pleito – quando vimos a Polícia Rodoviária Federal fechar estradas para impedir eleitores de chegarem às urnas.
A vitória, construída sob uma infinidade de contradições, representa a superação de uma fase obscura da história do Brasil, onde demos de cara com um inimigo que representa absolutamente tudo que abominamos.
Para os trabalhistas, Bolsonaro e o bolsonarismo sempre significaram o retorno daqueles que nos apearam do poder em 1964, nos prenderam, nos torturaram, nos exilaram e nos mataram.
Interromperam nosso projeto de Brasil. Sufocaram um sonho.
Sonhos, porém, nunca envelhecem. O PDT voltou a oferecer ao Brasil – de forma real pela primeira vez desde a morte de Brizola – a sua alternativa de projeto de país em 2018, com Ciro Gomes.
Ciro carregará consigo o legado de ter reacendido a chama adormecida do trabalhismo e ter posto aos quatro ventos uma linha política de quase 100 anos de tradição no nosso país.
Foi graças a ele e a este feito, que conheci a história do partido e me filiei ao PDT. Dentro, vi que Ciro estava a cumprir o papel de levar ao povo brasileiro uma carta escrita pelos trabalhistas há muito tempo.
No início desse ano escrevi sobre a necessidade urgente que nos cumpre, de pensar e criticar. A tônica era para toda a esquerda – ou o chamado “campo progressista”, como queiram.
Continua sendo preciso. Afinal, ao mesmo tempo que a vitória de Lula representa os pontos positivos já citados acima e tantos outros, ela está longe de ser “a nossa vez. ”
Esse possivelmente será o governo de maior coalização desde a redemocratização. As concessões, que começaram antes mesmo da campanha eleitoral (vide Alckmin), tendem a aumentar com o passar do tempo, a inexorável queda de popularidade do presidente (como ocorre a todos), a oposição de milhões de pessoas que não só não votaram como odeiam Lula e as dificuldades econômicas e políticas impostas pela herança da crise que nasceu no governo Dilma e está à beira de fazer aniversário de 10 anos.
O trabalhismo foi capaz de vencer e disputar para valer eleições majoritárias em diversas ocasiões da história do Brasil. O que nos levou ao poder pela primeira vez, contudo, foi um processo revolucionário, e não uma eleição.
É a partir do legado varguista (fruto das transformações de um governo fruto de ruptura) que elegemos, nas urnas, o próprio Getúlio, Juscelino e Jango vice duas vezes – ascendendo à presidência após a renúncia de Jânio.
Após a redemocratização, e toda a sabotagem sofrida por Brizola após a volta do exílio (perda da sigla do PTB é o maior símbolo disso), ainda fomos capazes de mandar um recado contundente em eleições como a de 1989, sem falar na bem-sucedida experiência dos governos de Leonel e Darcy no Rio de Janeiro, que nos renderam os CIEP´s.
Então, o que aconteceu em 2022, se 2018 trouxe uma perspectiva de crescimento tão positiva?
Obviamente, não cabe a mim, diante de um resultado tão recente e de um processo eleitoral tão difícil, ser resolutivo em absoluto no que diz respeito ao tema.
Contudo, algumas lições já se podem tirar das urnas de 2022.
Uma delas é de que não adianta escrever a mais bela carta se for para lê-la de maneira que ninguém a quem está sendo enviada entenda.
Muito menos se for lê-la gritando.
Aqui, vale o ponto de que muito se fez se ouvindo pouca gente e levando a quase todos à tira colo, tendo a própria direção nacional do partido sendo escutada menos que deveria.
A outra é que claramente não se faz partido de cima para baixo. Sem base, não há como eleger um presidente da república que de fato seja nosso.
A Juventude Socialista da Bahia foi a que mais viajou nessa campanha, dentre todas as Juventudes do partido no Brasil. Em 35-40 dias, o carro alugado marcava mais de 10 mil quilômetros rodados. Como ir da terrinha até o Chile.
Em muitos lugares, a campanha de Ciro só chegou a ser conhecida por conta de nós.
Não aceito ser chamado pelos adjetivos que hoje são atribuídos a Lupi e outros dirigentes e lideranças do partido que não se posicionam conforme espera a magoada bolha cirista que restou, pois sei que fiz – como poucos – tudo o que pude por essa campanha (desde a pré-campanha).
Enquanto isso, o sofá, a cama quente, o calor de casa e a rotina eram os locais preferidos de quem confortavelmente arrotava verdade e palavras de ordem a respeito de tudo e todos no Twitter, como fazem até hoje.
Gente que muitas vezes nunca se filiou e, filiada, nunca construiu um movimento de base. Nunca expandiu o partido pelo movimento estudantil secundarista ou universitário. Gente que nunca disputou um sindicato, nunca se propôs a ser líder na sua igreja ou mesmo a se colocar como liderança do seu bairro.
O cirismo é, definitivamente, a doença infantil do trabalhismo. E isso diz muito mais a respeito dos que assim se intitulam do que do próprio Ciro Gomes, que sempre alertava, principalmente entre 2019 e 2020, para a necessidade de não se criar uma horda que funcionaria como ventríloquo dele mesmo.
É possível sentir, a cada manifestação contra o governo eleito – ou mesmo contra os que se aproximam dele de qualquer modo – uma mágoa petulante que se confunde com a húbris indexada na linguagem. Todos são traidores nessa teoria conspiratória tão infinita quanto ridícula.
Pois então, para que escrever tanto a respeito?
A culpa é de quem, tendo vivido os últimos 10 anos de Brasil, parece ter se esquecido do que passou logo depois do resultado do pleito eleitoral – ou até mesmo durante o próprio 2º turno, diga-se.
O Brasil é um país em disputa. Assim será por todo o sempre. Essa disputa possui uma infinidade de níveis. É óbvio que o que gostaríamos todos de ver era o retorno da nossa linha política à presidência da república. Porém, com a ausência dela, o que nos cumpre?
Definitivamente não é ter ojeriza do governo por não ser suficiente, diante daquilo que um dia fomos e do que gostaríamos de ser – e sabemos que seremos em um determinado momento histórico. Mais dia, menos dia.
Lula, com todas as suas contradições, sendo o fiador de um modelo econômico distante do que por nós foi proposto, ainda é o símbolo de uma vitória eleitoral que representa uma frase dita por Brizola em uma palestra universitária logo após o retorno do exílio.
“O velho Marx, se viesse ao Brasil, ficaria surpreso! Ele diria: Ora, vejam! Eles além de classes têm castas! ”
Sem realizar nenhuma mudança estrutural no modelo econômico, Lula conseguiu ser odiado pela elite brasileira, vítima de perseguição jurídica, ver fazerem com sua família o mesmo que fizeram com a família do presidente Vargas.
Agora, todos esses atores do cenário político-econômico seguem no cenário. De que lado deve estar o PDT? Naturalmente que do lado oposto à classe dominante que também nos odeia.
É importante, na política, aprender com as derrotas, dizia novamente o próprio Brizola. E o PT venceu as eleições. Por quais razões eles e não nós? Não fomos capazes de produzir uma liderança que se comunicasse com o povo brasileiro como eles? Ou será que lá estão pela medida das concessões feitas ser muito mais alta do que as nossas desde sempre?
A política é muito menos preta ou branca e muito mais cinza. É necessário compreender e aceitar isso, como parte do processo de formação.
Muitas coisas, que podem parecer tão contraditórias, são verdadeiras ao mesmo tempo. O Partido dos Trabalhadores não compreende, em sua totalidade, o projeto de Brasil do Partido Democrático Trabalhista. Se assim fosse, possivelmente seriam um partido só.
Contudo, diante do cenário atual, o que compete aos trabalhistas é assegurar dias melhores a um povo brasileiro que sofreu o pão que o diabo amassou na última década e, sobretudo, no governo Bolsonaro.
Fomos vítimas do ódio de classe, da geopolítica norte-americana e dos interesses de uma elite que detesta o povo do país onde vive. É hora de reparar muita coisa.
Se colocar em posição claudicante, neste momento, beneficia a quem e ajuda a quem? É necessário ter lado, sem perder a altivez da independência de uma luz que nos é própria.
É hora de ajudar, portanto, o governo contraditório e cheio de dificuldades, aliado de muitos que não amam o Brasil e com um projeto econômico que não abarca o que sonhávamos.
Mas é hora também de apoiar o governo de um operário que, tendo realizado mudanças de símbolos enquanto governou, amargou uma prisão política e ainda foi capaz de derrotar, nas urnas, os maiores inimigos da história do Brasil.
Contradição? Claro, cara pálida. Estamos falando de política.
Enquanto isso, vamos movimentar a base, ocupar espaço, disputar a educação, a terra, o direito do povo preto, das mulheres e da comunidade LGBTQIA+.
Garantir trabalho e emprego para o nosso povo. Proteção jurídica. Brigar por uma nova legislação trabalhista, patrociná-la.
Interiorizar o partido, ter candidatos a vereador e prefeitos em mais cidades. Eleger mais deputados, senadores, governadores.
E, sobretudo, nunca nos curvarmos, pois isso é o que nos fazer perder a preciosa identidade de um partido que carrega quase 100 anos de tradição política sob sua responsabilidade.
Viva o Partido Democrático Trabalhista!