A ilusão da economia sem política nas críticas à política fiscal de Ciro

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Por Bruno Machado – Uma das críticas mais pertinentes já feitas ao livro de Ciro e seu plano de desenvolvimento nacional se refere à falta de déficits fiscais em seu plano, o que levaria a uma “receita sem fermento“.

Pode estar em grande medida correta a crítica quanto ao apego à poupança interna e ao equilíbrio orçamentário de Ciro. Já que déficit fiscal que não ultrapasse a capacidade produtiva e cause crescimento econômico suficiente para manter a relação dívida/PIB constante não gera inflação de nenhuma maneira.

Se o governo optar por um déficit visando investimento público e não tenha sucesso em gerar crescimento do PIB suficiente, haverá aumento da proporção dívida/PIB, o que eleva o tamanho da fatia do orçamento federal a ser gasto com juros da dívida pública em uma situação de forte desvalorização da moeda, seguida de inflação alta e choque de juros para atrair dólares. Não podemos esquecer que um país que tem como moda o real sempre corre esse risco monetário, ainda não imprimimos moeda internacional.

Entretanto, o mais relevante nisso tudo talvez seja o fato de colocar-se o foco na economia de forma isolada da política. Por exemplo, nossa moeda é mais fraca que as moedas de alguns países por motivos concretos de menor desenvolvimento tecnológico e menor capacidade militar do Brasil. O dólar não é a moeda mais forte do mundo por motivos estritamente econômicos, as razões econômicas são resultados também de poder geopolítico. Não podemos imaginar que nossa moeda estaria no mesmo patamar do dólar e do euro através de novos modelos econômicos se nada mudar em nossa força geopolítica, em nosso progresso tecnológico e na nossa relevância militar no mundo real.

Além disso, para que o governo faça um déficit que gere crescimento do PIB suficiente para que se mantenha a relação dívida/PIB, os governantes precisarão convencer as elites econômicas nacionais e internacionais da capacidade do déficit de “se pagar” ou sofrerá um boicote, articulado ou não. Não há lei que obrigue os dólares em circulação no país a se manterem aqui em qualquer situação e o consumo das reservas cambiais criaria uma situação de medo que aceleraria ainda mais seu consumo, podendo esgotá-la. Devemos usar nossas gordas reservas em dólares para nossa segurança, não colocá-las propositalmente em risco.

Além disso, se Ciro Gomes já tem um enorme desafio pela frente ao tentar buscar adesão de parte da elite econômica nacional a seu plano de desenvolvimento, seria insano desde já falar em déficits fiscais anuais. Caso vença em 2022 e tenha sucesso em colocar o Brasil em uma rota de crescimento e investimentos públicos bem sucedidos, Ciro poderá colocar propostas de déficits fiscais voltados ao investimento público produtivo no debate político, e voltaríamos a discutir economia política. No nosso modelo de sociedade, o poder sobre as forças produtivas está concentrado nas elites econômicas do país, não adianta pensarmos que podemos alterar (sem romper com) o modelo econômico sem convencê-las antes que a alteração não irá prejudicá-las.

Por: Bruno Machado.