Terceiro setor e o poder público: Parte I

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Por Ana Rosa López Mendes – Muitos se levantam contra o terceiro setor, mas também muitos se levantam contra o Estado. Por que não procurar entender melhor esse embate?

Antes de começarmos, vamos procurar entender o que é o primeiro, segundo e terceiro setor. O primeiro setor é o governo, que é responsável pelas questões sociais, estão nele: as prefeituras e suas secretariais, os governos estaduais e suas secretariais, a presidência da República e todos os ministérios. O segundo setor é o setor privado, responsável por questões individuais, é reservado a todas as empresas que geram lucro, exemplos: padaria, açougues, bancos. Com a falência diária do país, o setor privado passou a ajudar a resolver os problemas sociais por meio das inúmeras instituições que constituem o chamado terceiro setor. Em outras palavras, o terceiro setor é composto por organizações sem fins lucrativos e organizações não governamentais que visam à prestação de serviços públicos. Sabe aquele pequeno projeto que ajuda animais de rua? Aquela organização que leva donativos a os abrigos de idosos e crianças da sua cidade? Isso é o terceiro setor.

E o maior sonho de todo presidente ou diretor de uma organização sem fins lucrativos é que um dia o terceiro setor não precise mais existir, pois no dia que esse feito acontecer, saberemos que o Estado estará não só conseguindo cumprir seu papel, mas também estará dando conta de todas as necessidades básicas da população.

Enquanto isso, existe em uma realidade distante. Deveríamos enquanto civis agradecer o trabalho ofertado pelo terceiro setor, pois muitos são os projetos que funcionam com regularidade, seriedade, qualidade e de forma gratuita atendendo várias das infinitas necessidades do nosso povo, seja na educação, na saúde, no esporte ou na alimentação por exemplo. E muitos são os colaboradores engajados com essas questões socialmente relevantes, cumprindo um papel que nasce da empatia, do desejo de mudança e fazendo com dedicação um papel que não deveria ser deles.

Sendo assim, temos de um lado o trabalho de assistir o povo em situação de vulnerabilidade ou não (pois o terceiro setor não tem distinção de classe) e do outro, o grande vilão, que nos ronda há mais de 20 anos que vai não só na contra mão da construção e luta contra a desigualdade social, mas promove a continuidade dessa assistência que deveria ser temporária e um aumento contínuo do abismo social, que é o neoliberalismo.

Em uma de suas palestras, Silvio Caccia Bava, editor-chefe do jornal Le Monde Diplomatique, fez uma analogia com a década de 80, quando a mobilização por direitos básicos era reprimida pela ditadura. Com a Constituição de 1988, houve um sensação de melhora no cenário brasileiro, até que se iniciou a política neoliberal, garantindo a mínima intervenção do Estado, prevalecendo a privatização e destruindo paulatinamente todo um trabalho de desenvolvimento do terceiro setor e do próprio Estado.

Eis que começam a surgir as OSCIP que são as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, e as OS – Organizações Sociais para assistir o povo, sem fins lucrativos e prestando serviço de caráter público, pois no momento em que essa política sugadora privatiza a saúde, a educação, o lazer e outros âmbitos inseridos nos Direitos Sociais que se encontram no art. 6° da Constituição Federal, o poder público deixa de assistir as pessoas em situação de vulnerabilidade e miséria, fazendo com que estes recorram a essas organizações.

Parceria público-privada e a Lei nº 13.019/2014

Por mais que já exista parceria entre Administração Pública e Terceiro Setor constitucionalmente falando, legislada pela Lei nº 13.019/14, que estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, isso ainda é pouco. Visto que, por mais adequadas que sejam as instituições, por conta da falta de documentos seja de estatuto social, ata ou não possuírem registro, não conseguem o titulo de OSCIP e automaticamente não se adentram nessas parcerias com o poder público. Mas, para não fugirmos do ponto chave, podemos tratar desse sintoma em um próximo texto.

E nasce então um questionamento: mesmo com tanto trabalho prestado, por que não inserir o terceiro setor em uma bancada ou ministério?
Muitas são as organizações alinhadas com um projeto nacional de país, que acreditam veemente na potência que temos para destruir essa divisão social, como o SOS Mata Atlântica, AACD que virou referência para crianças com deficiência, APIB para articulação dos povos indígenas e centenas de outras que poderiam ser citadas, por quê não inseri-las no meio?

Suicídio político? Talvez. Mas se houvesse alguém do Poder Público com a decência e coragem de admitir que infelizmente o Estado ainda não consegue assistir e garantir todos os direitos do povo, o jogo viraria para estas organizações no sentido de que: teriam mais autonomia nas tomadas de decisões e valorização enquanto organização não governamental, pois muitas foram as instituições que ao longos dos anos foram e ainda são acusadas de lavagem de dinheiro. Provando assim, através de relatórios de atividades, equipe e prova social, que existem muito mais organizações boas do que ruins e que, em qualquer setor infelizmente existe esses dois lados. Casaríamos assim, o primeiro e o terceiro setor para que futuramente se fundissem e o terceiro existisse somente em livros de história e na memória de quem fará parte dessa construção política.

Uma vez que o norte é e sempre será a justiça social, sem desviar da atenção real da pobreza e das reais soluções. Sendo assim, existiria um comprometimento de apoio e melhorias na ação estatal, enriquecendo a qualidade das políticas públicas e aderindo a ideia da responsabilidade compartilhada, especialmente nos temas emergentes do desenvolvimento humano. Que possamos revolucionar o terceiro setor, unindo-o em harmonia com o Estado, pois como diria Marx, ‘’as revoluções são a locomotiva da história’’.

Que possamos revolucionar a história em prol da nossa brava gente e que nesse primeiro texto e momento, possamos nos perguntar: de qual forma introduziríamos o terceiro setor no Senado e ou nas Câmaras? Será que podemos unir: terceiro setor, senadores/vereadores ou deputados, Governo Federal e Tribunal de Contas em uma mesma empreitada?

Pensemos em soluções assertivas e aguardemos o próximo texto, para abrir horizontes e ressignificar a luta do terceiro setor, observando a importância de adentra-lo em espaços políticos de forma direta.

Por: Ana Rosa López Mendes.