A Sustentabilidade do Crescimento Econômico e do Próprio Governo Lula

A Sustentabilidade Do Crescimento Econômico E Do Próprio Governo Lula
A Sustentabilidade Do Crescimento Econômico E Do Próprio Governo Lula
Botão Siga o Disparada no Google News

Por Christian V. Kuhn

A Sustentabilidade do Crescimento Econômico e do Próprio Governo Lula

O último levantamento das Contas Nacionais Trimestrais feito pelo IBGE causou certa euforia, principalmente aos adeptos do atual governo. Segundo o instituto, em relação ao primeiro trimestre do ano, o PIB elevou 0,9% no trimestre encerrado em junho. Este indicador apresentou valores positivos pela oitava vez seguida. Contudo, foi exatamente a metade do desempenho registrado no trimestre anterior (1,8%).

No cotejo ao mesmo trimestre do ano anterior, o PIB obteve alta de 3,4% no 2º trimestre desse ano. Desse modo, no acumulado de 2023, o crescimento econômico foi de 3,7% no primeiro semestre, quando comparado a igual período do ano passado. Já nos últimos 12 meses, a elevação do PIB chegou a 3,2%. Com isso, segundo o IBGE, a nossa produção de bens e serviços se encontra atualmente 7,4% além do que nível atingido no final de 2019, antes da pandemia da COVID-19, o que representa um crescimento médio anual de 2,0% no período.

Nesse último trimestre, comparado ao trimestre anterior, o setor que apresentou melhor performance foi a Indústria (0,9%), seguido do setor de Serviços (0,6%), enquanto a Agropecuária obteve um crescimento negativo de 0,9%. O segmento que registrou maior elevação na Indústria foram as Indústrias Extrativas (1,8%), enquanto que a Indústria de Transformação cresceu somente 0,3%. Apesar disso, relativamente ao mesmo trimestre de 2022, a Agropecuária demonstrou majoração de 17%, muito acima de Serviços (2,3%) e Indústria (1,5%).

Por sua vez, pela ótica da despesa (componentes da demanda agregada), a alta foi puxada pelas Exportações de Bens e Serviços (2,9%) – abaixo da elevação das Importações em 4,5% – seguido do Consumo das Famílias (0,9%) e do Consumo do Governo (0,7%), ao passo que os Investimentos na produção (Formação Bruta de Capital Fixo – FBCF) estagnou em apenas 0,1%. Cabe ressaltar que se foi interrompida uma sequência de dois trimestres com variações negativas nos investimentos. Na comparação com igual período do ano anterior, os mesmos componentes da demanda registraram a melhor performance: Exportações elevaram em 12,1%, sucedidas do Consumo das Famílias (3,0%) e Consumo do Governo (2,9%). Todavia, a FBCF sofreu uma queda de 2,6% na mesma comparação.

Convém destacar que as importações foram bastante impactadas pelos itens de máquinas e equipamentos, justamente aqueles que compõem a Formação Bruta de Capital Fixo. Ou seja, produtos que deixaram de serem fabricados internamente para serem adquiridos junto a outros países. A preferência pela importação de bens de capital pode ser parcialmente explicada pela sobrevalorização do câmbio.

Destarte, o governo brasileiro se depara com pelo menos dois problemas. Um se refere à herança de uma economia que, nos últimos 10 anos, padeceu de três anos de forte recessão, o biênio 2015-2016 (-3,6% e -3,3%, respectivamente) e durante a pandemia em 2020 (-3,3%). Em compensação, apenas em 2021 e 2022 o PIB cresceu próximo ou acima desses patamares (4,2% e 2,9%, respectivamente). Devido, principalmente, ao baixo crescimento derivado da agenda dos governos Temer e Bolsonaro nos demais anos, a recuperação da recessão de 2015-2016 foi a mais lenta de nossa história, apenas sendo revertida no ano passado. Ou seja, tão somente após 8 anos, o PIB voltou a se encontrar em patamar superior ao que registrava em 2014.

Para o presente ano, a perspectiva é de voltar a subir de 2,6% (última semana) a 3,0% (últimos cinco dias úteis), de acordo com o último Boletim Focus do Banco Central do Brasil – BACEN (08/09/2023). Por conseguinte, caso se confirme o crescimento do PIB previsto na última semana pelo BACEN, teremos um crescimento médio anual de pífios 0,39% no decênio 2014-2023, abaixo da média do crescimento populacional de 0,6% ao ano, e consequentemente, uma queda do PIB per capita.

O outro entrave é a dificuldade política de implantar uma agenda de crescimento e desenvolvimento que justamente rompa com esse fraco desempenho econômico. Com ínfima margem na votação frente ao seu adversário no segundo turno, o presidente Lula vem buscando via o presidencialismo de coalisão uma maioria que não lhe foi dada através das urnas. Em virtude disso, por ora, seu governo tem se dedicado a propostas na área econômica que visam a adesão dos segmentos mais moderados do Congresso (vulgo Centrão) e da sociedade civil, casos fundamentalmente do Arcabouço Fiscal e da Reforma Tributária (concentrada até o momento na tributação da produção e consumo de bens e serviços).

Ocorre que essas medidas são insuficientes para sustentar um crescimento econômico que permita uma elevação do PIB per capita e compense o pífio desempenho dos últimos 10 anos. Sem a elevação dos investimentos na produção, um plano de reindustrialização, uma maior justiça tributária – onerando mais aqueles que possuem maior capacidade de pagamento (os mais ricos) – e a revisão e reversão de reformas e medidas impopulares promovidas pelas duas últimas gestões, dificilmente a atividade econômica alcançará até 2026 um desempenho próximo ao verificado nos governos Lula I (2003-2006), com crescimento médio de 3,5% ao ano, e Lula II (2007-2010), de 4,6% ao ano.

Assim, o governo precisa superar os obstáculos políticos que lhe estão sendo impostos, sob pena de assistir a ressureição de uma oposição de extrema-direita, como vem ocorrendo nos EUA com o governo Biden. Sem romper com a austeridade fiscal e o fiscalismo do primeiro ano de seu governo, e sem promover uma agenda desenvolvimentista, corre-se alto risco de Lula registrar o seu pior desempenho frente à presidência do país. Será uma decepção que pode lhe custar a sucessão de seu mandato.

Christian V. Kuhn é economista. Doutor em Economia do Desenvolvimento/UFRGS, consultor e professor do Instituto PROFECOM