Por que é pior do que o Holocausto?

Por que e pior do que o Holocausto
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Não basta mais que apenas homens de Estado e jornalistas denunciem o massacre em Gaza. Depois dos episódios mais recentes, essa é uma pauta da humanidade. Todos devemos vociferar contra o ódio, a covardia e o oportunismo de Netanyahu. Pressionar os governos para romper relações econômicas e diplomáticas com Israel é um caminho viável. O que estamos vendo é o uso do aparato sofisticado da inteligência humana que um povo acumulou meritoriamente e corajosamente na forma da ciência e da tecnologia de Segurança e Defesa, para que ele o destine a uma brutalidade sem limite.

Eu me sinto solidário aos inúmeros judeus e não-judeus mundo afora que se somam ao coro da denúncia contra essa guerra e contra o governo que a realiza e os que o apoiam. Mas creio que, após os últimos acontecimentos, é preciso radicalizar. Abrir fogo contra pessoas que rastejam para chegar à pouca comida a que tem acesso é ultrapassar as fronteiras do tripúdio, do sadismo, da crueldade, da desumanidade.

Imaginem: esmagados por todos os tipos de artefato destrutivo (exceto, por enquanto, ao nuclear), encurralados por determinação das Forças inimigas a um canteiro do território total em que viviam e sem qualquer oportunidade para sentir algo além de medo, desespero, pânico, humilhação, as hordas de famintos recebem parcos alimentos doados em ações humanitárias; mas o pequeno lapso de atuação da esperança nesses corações é rapidamente liquidado por disparos premeditados. É muito mais do que covardia.

Em nada diferenciam-se esses exilados de si mesmos, porque exilados de suas esperanças, daqueles descritos por Primo Levi em suas narrativas. Sim, Lula e outras autoridades de Estado acertaram em ter chamado de genocídio o massacre em Gaza. Mas convém ser mais enérgico agora. O que está acontecendo é pior do que o holocausto e temos que reconhecer isso.

O holocausto não foi o maior massacre de um povo na história humana. Quantitativamente, o morticínio dos habitantes tradicionais das Américas (que, para si mesmos, não eram apenas um povo, mas eram quase isso para os que os massacraram) foi muito mais expressivo. O holocausto foi mais chocante, dado o caráter industrial da carnificina posta em prática e da perversidade da ideologia que o respaldava. A história do Século XX e todos os produtos do cinema, da literatura, da canção popular e das dramaturgias de plataforma já veiculados e a se produzir não deixarão ninguém esquecer do que os nazistas foram capazes de fazer.

Mas o que dizer do massacre nas filas de alimento? Cem pessoas jamais serão seis milhões. Porém, essas cem morreram sob o mesmo ímpeto sádico, cruel e desumano que o praticado nos campos de concentração. E com um agravante que o torna o mais chocante degrau de um edifício genocida: ele aconteceu oitenta anos depois. O massacre sádico em Gaza está sendo praticado por netos e bisnetos de quem teve momentos de esperança em meio à pura penumbra do medo, do desespero, do pânico e da fome roubados pelo extermínio.

Não basta dizer que Gaza vive uma guerra injusta. É um holocausto piorado, não pelos resultados de uma necrocontabilidade, mas pelo que move as Forças israelenses a fazer o que estão fazendo e como estão fazendo: achincalhando uma gente no momento em que ela é iluminada pela última das paixões humanas, a esperança.

Não já seria a hora de se falar no Tribunal de Nuremberg para o governo de Netanyahu?