Os extremismos bitolados no debate sobre direitos de gays e pessoas trans

Os extremismos bitolados no debate sobre direitos de gays e pessoas trans
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O debate sobre os direitos de gays e pessoas trans é marcado por posições extremas que não representam a sensibilidade da maioria esmagadora da população, e que portanto refletem em seu âmbito a crise de legitimidade que destrói nossa democracia.

De um lado, pequenos grupos que gostariam de vetar direitos a gays e trans, evitando qualquer política de inclusão, tolerância e combate à discriminação destes cidadãos. Embora não possam dizê-lo com todas as letras, consideram que o arcabouço legal deveria reproduzir o juízo que fazem destes indivíduos, que consideram ‘degenerados’, ‘corrompidos’, ‘aberrações’, e até mesmo ‘sub-humanos’.

Evidente que a moralidade e as práticas sociais dominantes na nossa História fazem com que gays e pessoas trans tenham demandas de proteção e segurança específicas, e são necessárias políticas públicas que as defendam. O espaço da escola é um dos mais aptos para que sejam transmitidos, em termos gerais, noções de tolerância e boa convivência.

Por outro lado, alguns militantes envolvidos com pautas identitárias voltadas para estas populações partem da premissa de que tem de realizar uma guerra cultural contra o cristianismo e a moralidade popular.

Dias desses, um figura dessas, na ânsia de rebater o discurso [quase] segregacionista que mencionei no primeiro parágrafo, fazia ataques à religiosidade, Escrituras, crenças e igrejas cristãs, responsabilizando-as, inclusive, por crimes de ódio contra gays e trans. O sujeito chegou a dizer que o Estado tinha de impor determinada educação, e que todos que não se adequassem a ela deveriam sair da escola pública.

É uma visão de bolha, autoritária e alienada do ‘chão da escola’ e da periferias das grandes cidades. Primeiro, o Estado não deve impor de cima para baixo nenhum modelo fechado de Educação sem escutar as comunidades, a quem a escola realmente serve e pertence. Segundo, qualquer prática fechada de educação que pretenda passar como um rolo compressor sobre as crenças da comunidade escolar vai enfrentar poderosa resistência dos alunos e responsáveis.

Diferente do que imagina o militante identitário, não serão elites alienígenas reclamando de um modelo educacional imposto cima para baixo e que contrarie os valores religiosos mais básicos. E sim os pobres da periferia que, vejam só!, são esmagadoramente cristãos! A solução que o sujeito aventava, “excluir da escola” quem não se adaptasse aos valores que ele gostaria de propagar, é puro nonsense.

O cristianismo, especialmente o evangélico, é a religião dos mais pobres e das camadas populares.

O extremismo bitolado dos dois lados só pode dar, em curto e médio prazo, em paralisia do debate, radicalização das posições, e conflito e violência discursiva, simbólica e física. Em vez de pacificar a sociedade, estas posições se afastam do povo e promovem cisões.

A tolerância, a inclusão, a cidadania tem de ser incentivadas e implementadas a partir de um diálogo com os pressupostos da moralidade da própria população. Tratar a questão como uma agenda ou produto importado a ser enfiados na goela dos brasileiros é dar continuidade a um processo de colonização que sempre nos tratou como “selvagens” inadequados aos critérios civilizacionais emanados do Ocidente.

Acaba por ser mais uma forma de barrar a consolidação de uma verdadeira democracia no país. Que só pode ser estabelecida de baixo para cima, representando o imaginário do brasileiro comum.