Crise na Ucrânia: A imprensa brasileira e a propaganda nazista

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Por Cesar Benjamin – Não tenho palavras para descrever a histeria promovida pelas agências de notícias internacionais e a subserviência da imprensa brasileira. Ontem havia dois fatos relevantes no front ucraniano: os contingentes russos terminavam suas manobras (em território russo) e começavam a retornar às suas bases, enquanto 700 mil cidadãos russos estavam sendo removidos de Donetsk para escapar do bombardeio ucraniano. Diante desses fatos, o Estado de São Paulo escolheu a seguinte manchete: “Separatistas russos fazem uma série de ataques no leste da Ucrânia: conflito interno se agrava e Biden diz que Putin decidiu invadir.”

Esse humilhante alinhamento da imprensa me confirma a impressão de que os Estados Unidos decidiram firmemente escalar a guerra, mesmo sem participar dela. Ontem, escrevi a um amigo: “Os Estados Unidos estão buscando tornar inevitável uma intervenção russa na Ucrânia. Assim, conseguirão melar toda a relação da Rússia com a Europa e entregar um imenso abacaxi — a própria Ucrânia, um Estado falido — para a Rússia gerenciar. Com isso, a Rússia só perde. Resta saber como Putin vai manobrar para escapar desta armadilha.”

A imprensa é parte dessa engrenagem de guerra. O que estamos vendo só tem paralelo com a máquina de propaganda nazista. Se você acha que estou exagerando, leia abaixo o que escrevi em abril de 2020.

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Um dos aspectos mais impressionantes do livro “LTI: a linguagem do Terceiro Reich”, de Victor Klemperer, que a Contraponto publicou, é nos permitir conhecer o discurso nazista, tal como ele se desenvolveu do início do movimento até o fim da Segunda Guerra Mundial. Klemperer foi um professor de filologia que permaneceu na Alemanha observando atentamente o uso das palavras pelo nazismo desde a década de 1920 até 1945. A tese central, que defende, é a de que o nazismo se consolidou quando passou a dominar a maneira como as pessoas falavam, incluindo os seus opositores.

É um livro que alterou minha percepção do mundo. Quantos sabem que, no discurso, o nazismo falava em democracia e liberdade? Quantos sabem que a agressão era sempre dos outros, e os nazistas somente protegiam os valores do seu povo? Quantos sabem que o perímetro defendido pelo Exército alemão durante a guerra era chamado “fortaleza Europa”, área em que a civilização ocidental estava sendo protegida do ataque das “hordas asiáticas” (russos) e dos “agentes judeus” (americanos e ingleses)? Quantos já viram imagens de um Hitler bondoso, vegetariano, amigo das crianças e dos animais?

Dificilmente um alemão que vivia dentro desse espaço poderia construir uma visão de mundo que contrastasse um discurso tão esmagadoramente dominante.

Penso nisso quando olho para nós, que vivemos na área americana do mundo, também uma espécie de “fortaleza” guardada pelas agências de notícias controladas pelo Departamento de Estado.

Quantos pararam para pensar que, em plena pandemia, os Estados Unidos apertaram ainda mais as dramáticas sanções contra o Irã, impedindo o país – um dos mais atingidos – de comprar remédios e equipamentos? Quando se deram conta de que os Estados Unidos bloquearam mais fortemente o fornecimento de gás de cozinha para Cuba? Que impediram que o FMI destinasse apenas US$ 5 bilhões para a Venezuela combater o vírus em seu território? Quantos se dão conta de que asfixiar financeiramente a Organização Mundial da Saúde, neste momento, é um crime contra a humanidade? Quanto reconhecem como pirataria a captura de cargas compradas por terceiros países?

Pouquíssimos. Assim como os alemães sob o nazismo, nós também vivemos esmagados por um mesmo discurso dominante, em que agressão é defesa, mal é bem, e todo ataque – mesmo o mais sórdido – se justifica porque estamos sempre nos defendendo.

É hora de ler e reler “LTI: a linguagem do Terceiro Reich”. Para que possamos pensar de forma mais livre.

Por Cesar Benjamin