‘Racismo reverso’ não existe, mas identitarismo sim

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ANTONIO RISÉRIO é um intelectual complexo. Polêmico. Mas colocar em questão a sua abjeção ao escravismo, gravada em muitos textos, e principalmente no livro que escreveu sobre o tema, por conta desse último artigo na Folha, é uma demasia. Desenvolver tese sobre ‘racismo reverso, como Risério fez, produz um retrocesso significativo no justo combate que ele faz ao identitarismo. É pura provocação. Que não deve escantear a discussão sobre outro tema a que ele se dedica.

E É SOBRE IDENTITARISMO que vale discutir. Ele não surge com força a partir dos anos 90 por acaso. E nem é um produto da “abertura democrática”, como pretende uma das “cientistas políticas” a que costuma recorrer o Globo, para corroborar suas teses. No meu modo de ver, tem muito mais a ver com a derrocada trágica do dito socialismo real do Leste Europeu, na sequência da degradação ideológica provocada pela burocratização regressiva, marcante do período brejneviano.

O IDENTITARISMO passa a ser pauta não só no Brasil. Em todas as potências do capitalismo ocidental ele entrou com força, na esteira da perplexidade das esquerdas revolucionárias a partir da vitória conjuntural inconteste do anticomunismo. Vitória que se desdobrou numa desqualificação, também conjuntural, da prioridade da luta de classes.

FICOU MAIS FÁCIL, aos que não caíram no desalento total, a concentração nas lutas setorizadas, legítimas e justas. Mas pouco ameaçadoras ao regime capitalistas, porque mantidas no âmbito interno, das opressões setorizadas. E, não por acaso, transformadas em tema permanente de campanhas da mídia financiada pelo grande capital que delas se apossou para barrar o que restava de mobilização na luta de classes. Que delas se apossou para mantê-las nos limites de sua bolha. E delas se valendo para tentar impor a ideologia do “empreendedorismo” e da “inclusão” no sistema, para alguns privilegiados da sorte, no afã de sufocar de vez a proposta de desconstrução e superação previstos na luta de Classes.

NADA MAIS CONDIZENTE com a lógica do identitarismo, aliás, do que a teoria do “lugar de fala“, que transforma em adversários os que, não sendo pretos, ousam combater o racismo. Como se um comunista consciente, informado, pobre, mas branco, não tivesse direito a ser solidário na luta contra a discriminação social de pretos (ou negros? porque sempre fico em dúvida sobre a classificação aceita).

ENFIM, TODA A SOLIDARIEDADE com as lutas setoriais, desde que, ao invés de mantê-las encarceradas em seus limites específicos, sejam vinculadas à luta totalizante contra a opressão geradora de todas as outras porque opressões: a do grande capital sobre o mundo do trabalho. A opressão das classes dominantes no regime fundado na sacralização da propriedade privada sobre aqueles que se obrigam a vender sua força de trabalho para garantir sobrevivência minimamente digna.

E Luta que Segue!

  1. Considero o articulista uma pessoa muito respeitável, mas talvez caibam aqui algumas ponderações aqui que talvez já tenham sido passadas da hora aos elementos esquerdistas de matizes variados estarem a observar na tratativa do que a militância identitária se municia em seus debates.

    Essa perspectiva de “lugar de fala” ou de “racismo reverso” sob nenhuma perspectiva devem ser levados em conta e nem mesmo devem ser levados como premissa e começo a fazer minha contradição ao articulista logo nessa premissa que o autor do texto considera. Levar a perspectiva de inexistência de “racismo reverso” e mesmo o cunho da expressão é justamente aquilo que o identitarismo usa para colocar um incensamento e deificação da etnia a que querem levar em conta no seu proselitismo e que não leva em conta uma historiografia comparada que se faz necessária nos grupos étnicos que no decorrer da história.

    E a perspectiva de negação do racismo da parte de negros também, inclusive da própria negação da miscigenação que é a clara carga que faz da vida brasileira e de nosso povo ser o que é também faz parte da infame parte do movimento negro que é adepto das ideias de Abdias do Nascimento e seu odiento livro “Genocídio do Negro Brasileiro”, partindo da ideia de que o “genocídio” negro vem da miscigenação de nosso povo, defendendo inclusive a “proteção da raça negra” em um não casamento de brancos com negro e que os negros brasileiros casem entre si! Será concebível realmente isso no Brasil? O que se fará então com os santos do Candomblé, as festas de Yemanjá, as lavagens do Bomfim, as feitas de reizado? Serão jogadas fora? Desprezaremos a fusão do catolicismo com os credos africanos nas comunidades rurais por conta disso? Desprezaremos a incorporação do vocabulário africano e indígena (grupo ainda mais ignorado que os negros) na construção do português brasileiro? Entendo eu que isso é intolerável!

    Quem melhor explica, e convido ao articulista e a quem me ler, o fenômeno do racismo em sua comparação é o historiador português Francisco Bethencourt e o seu livro “Rascismos” que mapeando de forma comparada a disseminação do racismo seja no mundo árabe, na África, no Japão, na Alemanha entre ciganos e mesmo judeus ou puritanos norte americanos, a perspectiva de negação do racismo de negros para com brancos é também a cortina de fumaça para que entendamos no que o racismo se constitui: uma ideologia. E tão somente isso. E diga – se de passagem: é a ideologia que se busca hoje ser debelada justamente naquilo que faz do Brasil ser o que é: um país miscinegado, mestiço, de mulatos, caboclos, mamelucos, cafuzos e mesmo estes termos formando a taxonomia etnográfica de nosso país, não existem divisões ou chacinas étnicas de um índio brasileiro frente a alguém que é um misto de negro com índio, por exemplo. Essa taxonomia é tão somente um adendo da integração étnico – linguística e religiosa de nosso país, estando a perspectiva de nascido em terra brasileira, católico e lusófono, além do discurso fundante da nação e nossa bandeira e hino, os fatores muito mais interessantes e cimentadores de nossa unidade nacional.

    Se faz necessária uma reflexão sobre os manuais teóricos que fazem tantos papagaios de pirata nas redes sociais e plataformas de vídeo em que tantos ativistas jovens propagam suas bobagens, replicando uma cadeia de desinformação e de narrativa antibrasileira e antinacional, que desvia nossa atenção na abordagem que esse tema merece e que esgota nossas energias para um real debate da questão nacional, que está longe de ter essa perspectiva típicas do racismo científico do Século XIX, como bem querem os EUA com sua guerra híbrida: a questão toda é tão somente quem é patriota e quem não é.

    Silvério é justamente uma pedra no sapato e motivo de raiva dos identitários, pois esta gente via de regra faz os seus estudos nas velhíssimas tradições da “intelectualidade” brasileira: colonizada, busca nos outros aquilo que como brasileiros só encontraremos em nossa própria realidade e a relação de etnias e sua mescla só podem ser explicados em nossa própria história, que é um ponto totalmente fora da curva dentro do que isso pode ser, pois não há uma “raça” ou um grupo de “brasileiros étnicos” a que devamos nos referir ou defender. Repare que não uso o termo “raça”, taxonomia que a militância identitária brasileira importa de forma acrítica da intelectualidade estadounidense de segundo e terceiro escalão que ficamos a importar como se isso fosse a solução de nosso país. Portanto sim, existem negros racistas, como também brancos, como árabes, japoneses, ciganos, etc.

    E ele não mentiu em nada! Choca – se com as observações ou falsamente assim o faz, parte daqueles que se rendem há muito tempo as táticas de achaque, constrangimento e intimidação que o identitarismo faz ou as vacas de presépio, que vendo o problema que é meter a mão nessa cumbuca pra fazer o contraditório, preferem ir na onda. Os famosos covardes, que estão em alta por aí.

    E quem conhece a subcultura esquerdista nas universidades públicas, somada as idiossincrasias muito próprias do meio acadêmico, sabemos muito bem que a academia não raro é afeita a modismos e tendo suas vacas sagradas e iguais vacas de presépio para defenderem ideias que nem compreendem muito bem ou se deixa levar pelos sofismas e por essa reescritura da história brasileira fruto de um ovo de serpente de um revanchismo esquerdista que na prática, odeia o Brasil.

    Já é tempo, se for do interesse da esquerda a colocar as coisas nos seus devidos lugares: se as causas identitárias desejam discutir seus problemas junto à esquerda e a ela se associar, pois muito bem, mas estarão estes valores submetidos e agregados as perspectivas de trabalho, emprego, indústria e soberania nacional. Na dividida, estarão abaixo, pois o seu tom histriônico e revanchista é desagregador e isso num país em que a heterogeneidade predomina, torna ainda mais difícil a formação de maiorias. E o debate identitário, se quiser tornar – se producente terá de estar fundamentado a partir da sociedade brasileira, discutir o Brasil a partir de si próprio para si próprio, fundamentando suas teorias a partir da própria observação empírica, de forma a agregarem – se ao tecido nacional, libertando a si próprio da infame colonização intelectual que paira sobre nosso país até em quadros bem intencionados que desejam debater o Brasil, sob pena de estarem a desagregar a identidade brasileira e esgotar os segmentos que desejem elevar nossa nação a outro patamar, mas que são neutralizados por toda uma guerra de narrativas que é fomentada, financiada e levada a um protagonismo que não merece e assim o é em nome de interesses inconfessáveis.

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