A nova esquerda, radical contra o povo

A nova esquerda, radical contra o povo
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Diferentemente da direita, que, antes do bolsonarismo, sempre cultivou a autoimagem de ser moderada e transigente (ainda que muitas vezes fosse o contrário disso), a esquerda sempre referenciou sua identidade pelos seus elementos mais radicais.

Daí que, por muito tempo, propostas reformistas bastante avançadas, e que hoje seriam consideradas até “extremistas”, como a CLT, a Lei da Usura e o Estatuto do Trabalhador Rural, eram rotuladas de “conservadoras”, pois a “verdadeira esquerda” seria revolucionária e não faria menos do que nacionalizar todas as transnacionais do país e abolir a grande propriedade privada, sem qualquer diferenciação.

Não era raro, inclusive, que fosse a direita quem buscasse suas referências nos Estados de bem estar social estrangeiros – como Castello Branco ao criar o INPS com base no ATP sueco e Costa e Silva ao dizer que a social-democracia norueguesa era o seu modelo de desenvolvimento – enquanto, para a esquerda, qualquer coisa menos que as revoluções russa e cubana seria “reacionarismo” ou algo tendente a isso.

Porém, nos dias de hoje, tamanho é o comprometimento da esquerda com o grande capital, sobretudo pelo identitarismo, que não há mais espaço para o campo de esquerda manter seu radicalismo contra Wall Street, a Coca-Cola, a grande indústria farmacêutica etc. Para resguardar a postura radical e não descaracterizar a sua aparência, ela, então, reorienta seu radicalismo contra, adivinhem quem, o próprio povo.

Surgem, então, verdadeiras aberrações, jamais antes cogitadas, como dizer que a mestiçagem brasileira é resultado do estupro, que o Brasil é uma “terra indígena” e que os portugueses e seus descendentes são “invasores”, que os descendentes brasileiros de italianos, alemães, espanhóis, deveriam se envergonhar por a imigração europeia supostamente ter existido para “embranquecer o país” e desfazer a “nação negra” que seria e deve ser o Brasil e que os imigrantes teriam sido privilegiados com terras mil.

Enquanto até pouco tempo atrás era praticamente consensual entre a esquerda que a imigração europeia acelerou a transição do trabalho escravo para o trabalho livre e contribuiu para a formação da “consciência de classe” – quem de esquerda ou com um passado de esquerda nunca se emocionou com as memórias das greves operárias de 1917 capitaneadas por anarquistas italianos e espanhóis? – hoje a imigração virou um verdadeiro anátema, assim como o bandeirantismo, o descobrimento do Brasil e todos os demais processos formadores da nacionalidade.

Dessa forma, para a nova esquerda, todos os problemas do país são por causa do povo e dos seus ascendentes. Se o custo de vida está alto, a culpa não é do laissez-faire neoliberal e financista, mas do Pedro Álvares Cabral, do Borba Gato e do Seu Giuseppe que chegou no Brasil em 1880 e trabalhou em regime de semi-escravidão num cafezal paulista.

Ninguém escapa da sanha acusatória, nem mesmo os negros, acusados de violar a “terra indígena” que seria o Brasil, e os indígenas, acusados de macular a “nação negra” que o Brasil seria e deve ser.

Não é só desorientação. É mau caratismo também, e principalmente.

  1. Texto que mais busca confundir do que esclarecer.

    Mistura alhos com bugalhos e faz várias acusações de uma “nova esquerda”, mas o único fato que aponta dessa “nova esquerda” é um ato contra uma estátua de um bandeirante em SP. É uma generalização no mínimo descuidada. Quem é contra a mestiçagem e o que relação ou anátema se tem com o bandeirantismo? Seria importante separar o joio do trigo para não se criar falsas associações, pois ser contra o bandeirantismo que muito mal influenciou no ethos escravista brasileiro não tem nada a ver com o processo de mistiçagem tão exaltado por Darcy Ribeiro!!!

    Aliás, falta ao autor desse texto ler Darcy Ribeiro e entender que a questão de classe está miscigenado com questões identitárias na América Latina e se alimentam. (Lapso ainda mais marcante, pois imagina-se que um aluno da UFF deveria ter lido muito Darcy Ribeiro).

    O pior é o elogio às diretrizes dos ditadores militares sem expor que foi nesse período que mais se ampliou as desigualdades sociais e regionais, além das destruições da educação pública e saúde pública. Fermentaram o bolo de multinacionais para crescer o bolo, mas nunca repartiram esse bolo (muito pelo contrário).

    Talvez a “desorientação e mau caratismo” é de quem escreve peças acusatórias sem expor materialidades.

    Não se é contra o neoliberalismo que assola com muito mais vigor estas terras principalmente desde a década de 1990 em uma contraofensiva para que não efetivem a Constituição Federal de 1988, mesmo que esta seja apenas o melhor que se conseguiu passar em um Congresso desde aquele tempo dominado pelo “Centrão” (leia-se Direitão).

    A Esquerda Reformista deveria respeitar a Esquerda Revolucionária, mas principalmente entender que essa “sanha acusatória” deveria ter um mínimo de materialidade ou de exemplos de narrativas a que se pretende acusar para não parecer que se intenta tão somente ser “A Esquerda que a Direita Gosta” (e muitas vezes com a mesma linguagem utilizada por essa direita que busca radicalizar a classe média para se debater menos materialidades e agir com fígado – alguns ainda identificando traços de neofascismo).

    O cuidado sempre deveria ser importante não só para não misturar alhos com bugalhos, mas para não ser acusado de “Quintas” Coluna.

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