De Mandetta a Zé Dirceu, passando por João Santana, todo mundo é Ciro!

Como eu havia dito semana passada em “Lulinha Paz e Amor voltou, mas vai ser difícil tirar o PT do isolamento“, a euforia pela anulação das condenações de Lula duraria pouco. O que se viu foi o contrário, o PT colecionou batidas de porta na cara aos acenos enviados para o centro, e os balões de ensaio de possíveis vices de Lula foram todos furados. Luiza Trajano, General Santos Cruz, Alexandre Kalil, a aproximação com PSDB, tudo fracassou. Até mesmo a reaproximação com as cúpulas evangélicas deu com os burros n’água como informa uma longa e instrutiva matéria da Folha de São Paulo hoje: “Retorno da aversão ao PT no meio religioso, que hoje apoia em massa Bolsonaro, é um freio para o partido em 22“. Lula só tem recebido foras nos flertes que tem tentado.

Já do lado da candidatura alternativa à polarização entre Lula e Bolsonaro, Ciro Gomes desponta como a noiva da vez a ser cortejada no cenário eleitoral conforme detalhei em “Doria desiste, e Ciro-Mandetta cresce nos bastidores da centro-direita“. No primeiro momento, foi Aécio Neves, Tasso Jereissati, e outros líderes da centro-direita que apontaram o desejo de um possível casamento com o candidato da centro-esquerda. Dessa vez o próprio Mandetta mandou um recado para o pré-candidato do PDT de que se ele for carinhoso mesmo, a turma do centro topa namorar com ele: “Observo o Ciro há muitos anos na vida pública. É um homem que defende suas opiniões com veemência, mas não sei se ele tem esse desprendimento para enxergar o todo que está no entorno. Não sei se ele tem o primeiro pré-requisito, que é se despir das suas certezas e vaidades pessoais. Estamos na expectativa para que ele sinalize algo nesse sentido.

Alguns meses atrás eu já apontava essa tendência em “De ACM Neto a Márcio França, passando por Kassab, todo mundo é Ciro“. Pois bem, mais alguns sinais, fortes sinais, como diz o Ey Ey Eymael. O jornalista Guilherme Amado deu na Época que Ciro negocia com João Santana, o mago que conseguiu eleger a intragável Dilma Rousseff presidente duas vezes, para ser seu marqueteiro em 2022. Como se sabe, Santana é considerado um gênio do marketing político, tendo superado até mesmo seu mentor, Duda Mendonça, o outro gênio que elegeu Maluf, Pitta, e foi o criador do Lulinha Paz e Amor em 2002.

Em outro artigo de meses atrás celebrei a volta de João Santana ao debate público em suas entrevistas ao Roda Viva e ao Valor Econômico quando ele disse que Ciro seria o melhor candidato em 2022, e declarou abertamente que gostaria de trabalhar com o cearense. Além dos problemas com a justiça no passado devido aos pagamentos que recebeu dos financiamentos ilegais de campanha do PT por caixa 2, João Santana é considerado um inimigo pela ex-presidenciável Marina Silva, que hoje é aliada de Ciro. Em 2014, a campanha do PT feita pelo marqueteiro foi muito violenta com a ex-ministra do Meio Ambiente, que não tinha tempo de TV para se defender das alegadas mentiras que sofreu.

Porém, diante do boato lançado, um colaborador próximo de Ciro, o professor Gustavo Castañon, buscou explicar que Santana já pagou por seus crimes, e que quem ordena o assassinato de reputações em uma campanha eleitoral é o candidato e não o marqueteiro. Uma coisa é ter como chefe Lula ou algum petista, outra bem diferente é ter como candidato Ciro Gomes, segundo o membro da equipe do presidenciável, que demonstrou torcer para que a contratação seja concretizada:

Diante desse quadro duro para o PT, o ex-presidente do partido e braço-direito de Lula no seu primeiro governo, José Dirceu apontou as qualidades de Ciro Gomes e de seu partido em entrevista para Luiz Carlos Azenha do Viomundo:

O Ciro foi prefeito, governador, ministro. Eu convivi com ele. Um ministro de primeira linha. O Ciro é um senhor executivo. Ele assumiu a transposição do Rio São Francisco. Ele ajudou a ministra Marina Silva em um comitê de 11 ministérios por desmatamento zero. E é um quadro político, um líder político. O PDT tem uma tradição histórica fantástica. Vamos lembrar que a classe trabalhadora votou no PTB, que é o PDT, porque roubaram a sigla do Brizola e deram pra Ivete Vargas.

A despeito da relação conflituosa atual com o antigo aliado, Zé Dirceu indicou voto no candidato do PDT em um eventual segundo turno:

Ele tem todo direito de ser candidato. Tem dois turnos. No segundo turnos nós votaremos nele. Vejam bem. Mesmo que ele estivesse com uma facção da centro-direita.

A fala de Dirceu é muito emblemática. Demonstra que o PT reconhece a força de Ciro e do PDT, não só ideológica e programática, como eleitoral e de articulação política no sentido de atrair a centro-direita para sua candidatura de união nacional.

A cada dia que passa Ciro Gomes se consolida como o candidato que representa realmente uma perspectiva de mudança no cenário político brasileiro marcado pela hegemonia neoliberal em crise. A “pós-política” do revezamento entre PSDB e PT colapsou e na transição ascendeu a anti-política primeiro do lavajatismo inimigo do sufrágio, e depois o populismo bolsonarista que arrasta multidões insatisfeitas e ressentidas com o sistema político e econômico em crise.

Também hoje em entrevista para o canal MyNews, Ciro expressou muito bem que a saída não está nem na volta ao neoliberalismo pacificado de PSDB e PT, e muito menos ao neoliberalismo selvagem e fascista de Bolsonaro e dos corporativismos militar e judicial:

Quem quiser ser político, venha para a política, e largue a farda. Porque a política é o dia a dia. É nós contra eles. As Forças Armadas têm que estar comprometidas com o Estado nacional. Com nosso grande Projeto Nacional brasileiro. E tem que estar assentada em bases profissionais. O Bolsonaro transformou a cúpula das Forças Armadas brasileiras num partido político.

A fala de Ciro parece até banal e pouco intuitiva. Mas é muito mais profunda do que a mera condenação da politização das Forças Armadas. Quando ele diz que a política é “nós contra eles”, ele está colocando a perspectiva de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe sobre a ressignificação teórica do populismo enquanto linguagem da política, da expressão do povo na coisa pública e do debate franco e aberto entre interesses concretos antagônicos. O que Ciro vem conduzindo é justamente a criação de uma nova fronteira política entre o interesse nacional do povo (desenvolvimento e direitos sociais) e os interesses da oligarquia financeira internacional (especulação financeira e rapinagem do patrimônio público).

Ao riscar uma linha no chão entre o interesse nacional e o interesse anti-nacional, Ciro torna-se o líder carismático possível, viável, e necessário, para a superação da “pós-política” e da anti-política neoliberal. Tão viável, que a centro-direita liberal e o famigerado Centrão do interior profundo e real do Brasil, começam a aceitar a possibilidade de apoiar Ciro e seu Projeto Nacional de Desenvolvimento contra o desastre completo do bolsonarismo genocida. Até um líder experiente e sagaz como o ex-chefe da Casa Civil de Lula teve que reconhecer. De Mandetta a Zé Dirceu, passando por João Santana, todo mundo é Ciro.

Sair da versão mobile