A Petrobras lucra e o Brasil sangra

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A mídia vassala faz coro com o presidente da Petrobras, o “chicago boy’ Roberto Castello Branco na comemoração do primeiro lucro líquido da empresa em quatro anos. Os resultados consolidados de 2018 apontam lucro líquido de R$ 25,8 bilhões, que em Ebtda (lucro antes de juros, impostos, amortizações) chega a R$ 115 bilhões. O entreguista Castello Branco exulta o lucro da Petrobras e a mídia comercial bate palminhas.

Quando alguém como Castello Branco se alegra é porque o povo está sofrendo e o Brasil está sendo saqueado. Castello Branco não esconde que quer privatizar a Petrobras. Doutor em economia pela FGV, fez pós-doutorado na Universidade de Chicago, com bolsa do CNPQ, ou seja, à custa do povo brasileiro.

Castello Branco é uma das águias do capital financeiro. Foi diretor do Banco Central no governo Sarney, serviu a empresas do mercado de capitais e, antes de sangrar a Petrobras como seu atual presidente, imposto por outro “chicago boy”, Paulo Guedes, foi economista chefe da Vale por 15 anos. Comandou a lógica da redução de despesas a qualquer custo para elevar os dividendos dos acionistas. Logo, tem as mãos sujas do sangue das vítimas de Brumadinho. Ah, sim! Foi do Conselho de Administração da Petrobras em 2015, nomeado por Dilma Roussef, aquela ex-presidente que deu início à destruição da Petrobras, a partir da gestão de Bendine.

Mas, por detrás dos números, o que comemora o vassalo Roberto Castello Branco? Fundamentalista neoliberal, comemora o aprofundamento do processo de retorno do Brasil à primarização da sua economia, o seu regresso à condição de colônia, de disponível e dócil almoxarifado das potências capitalistas mundiais, as mesmas que querem roubar o petróleo da Venezuela em troca de dois caminhões de “ajuda humanitária”. A velha Venezuela antes de Chávez é a “nova” Venezuela pretendida por Trump/Guaidó e é o que o Castello Branco e o Bolsonaro desenham para o Brasil: uma Nação degradada à humilhante condição de poço de petróleo e fonte de commodities explorado por um consórcio criminoso de elites saqueadoras a serviço de interesses estrangeiros.

É sintomático da subordinação sabuja de Castello Branco que o seu comunicado apresentando os resultados da companhia em 2018 comece por louvar o acordo com o Departamento de Justiça do Império e a US Securities and Exchange Comission a respeito do complexo de refino de Pasadena, no Texas. Para ele, teria sido um exemplo de saqueio de uma organização criminosa contra a Petrobras. Só que não. O engenheiro e Consultor aposentado da Câmara dos Deputados Paulo Cesar Ribeiro Lima, um dos maiores especialistas em óleo e gás do Brasil, explicou em artigo recente (TCU engana o povo para entregar Pasadena) que o negócio de Pasadena foi realizado dentro dos parâmetros da indústria petrolífera mundial e estava perfeitamente alinhada com a estratégia da Petrobras à época. Eu mesmo tratei do assunto em vídeo publicado pelo canal do YouTube, Tattoo no Toco (A verdade sobre Pasadena):

No esforço para decifrar os resultados “positivos” (azuis) da Petrobras eu considerava que eles poderiam ser vistos à luz de alguns fatores alheios à esfera de atuação da sua administração, como o aumento do preço médio internacional do petróleo (Brent) e a sobrevalorização do real frente ao dólar em 31% no período, por exemplo. Pensava também que alguns fatores deviam-se a escolhas administrativas da empresa, como a redução dos gastos com juros em razão da redução do endividamento da estatal. Mas, enquanto escrevia este artigo resolvi conversar com lúcido presidente da AEPET – Associação dos Engenheiros da Petrobras Felipe Coutinho que me desvendou aspectos importantes dos resultados da empresa recém divulgados. [1]

A pergunta central é a seguinte: os resultados da Petrobras devem ser recebidos pela Nação como uma conquista a celebrar ou como sintomas de uma doença a ser curada?

“En este mundo traidor, nada es verdad ni mentira, todo es según el color del cristal con que se mira”, disse o pensador espanhol Ramón de Compoamor y Compoosório. E Benjamin Disraeli, político e pensador britânico, fez o alerta que atravessa os tempos: “há três espécies de mentiras: mentiras, mentiras deslavadas e estatísticas.”

O alerta aplica-se perfeitamente aos resultados da Petrobras de 2018 que Castello Branco brinda e a imprensa entreguista celebra.

O atilado analista Arhur Silva em recente artigo no Portal Disparada (Das veias abertas do Brasil escorre sangue negro – o lucro da Petrobras), foi direto ao ponto: “os números azuis da divulgação dos resultados ocultam a rapina dos inimigos do Brasil”.

Enquanto no resto do Planeta as empresas petrolíferas diversificam os seus investimentos para converterem-se em empresas de energia preparando-se para um mundo em que o petróleo já não será soberano na matriz energética mundial, os criminosos dirigentes da Petrobras concentram os seus esforços na produção de óleo cru. A Statoil norueguesa virou Equinor, de olho no mundo pós petróleo e vai investir US$ 215 milhões em energia solar no Ceará.

Enquanto isso, os brontossauros neoliberais da antiga escola de Chicago, oráculos do capitão trapalhão, primarizam a Petrobrás. Por quê? Porque produção de óleo cru dá resultados imediatos para os acionistas, ainda que à custa da destruição do futuro da empresa. A palavra certa é rapina. O descolado Mourão e os seus generais fazem cara de paisagem. Castello Branco entende bem como dar lucros imediatos aos acionistas em prejuízo de uma empresa no longo prazo. Ele foi economista chefe da Vale. É um dos assassinos de Brumadinho.

A venda de ativos estratégicos da Petrobras é prova suficiente da ação criminosa contra os interesses nacionais. A patifaria antinacional vem de longe, desde a doação acelerada do pré-sal, no apressado e desnecessário leilão de Libra, pela ex-presidente Dilma (País pode perder até R$ 331 bi com Libra, diz Ildo Sauer), cujo bônus de assinatura serviu apenas para fechar as contas do governo (o bônus de Libra foi utilizado para cobrir a redução de IPI dos eletrodomésticos chamados linha branca, com geladeira, fogões, etc), atolado no déficit causado principalmente pelo pagamento de juros da fantasmagórica dívida pública jamais auditada, jamais auditada contrariando a Constituição.

O processo de concentração da Petrobras em produção e venda de óleo cru, com a criminosa venda da petroquímica (Braskem) para a holandesa LyondellBasell, a redução da atividade de refino e ameaça de venda de refinarias, quando o mundo aposta em diversificação, acelerou-se com Temer e ganha a pressa do assaltante com o celerado Bolsonaro. Todas as petrolíferas do mundo são empresas integradas. Os criminosos entreguistas que tomaram de assalto a Petrobras a partir do interregno Temer e com maior desfaçatez sob o  comando Guedes/Bolsonaro tomam o caminho inverso: fatiam a empresa, esquartejam-na, enfraquecem-na, destroem sua sinergia para privatizá-la na bacia das almas.

Neste exato momento, em deslavada afronta à decisão do Ministro Lewandoski no âmbito da ADI 5624/MC DF, a Petrobras insiste na venda sem licitação das participações acionárias que importarão na perda de controle da TAG – Transportadora de Gás S/A, ANSA – Araucária Nitrogenados S/A, Subsidiária do Nordeste e Subsidiária do Sul.

A anunciada venda da TAG expõe as vísceras da perversidade e insanidade da gestão predatória e criminosamente entreguista da atual diretoria da Petrobras. A TAG opera um sistema de gasodutos com extensão de 4500 km que transportam gás natural da região petrolífera da Arara, no município de Coari, Amazonas, à Refinaria Isaac Sabá, em Manaus. Também abastece com gás natural da bacia de Campos e Santos a Região Nordeste. Faz o transporte de gás natural entre cidades do Nordeste. Enfim, é uma subsidiária integral da Petrobras que desenvolve em âmbito nacional um papel estratégico para a estatal e para a soberania e segurança energética do país.

Se é assim, porque Petrobras quer vender sua participação na TAG? A TAG dá prejuízo? Longe disso. A lucratividade da TAG é garantida porque não está sujeita à variação dos preços do petróleo no mercado internacional, como o é o caso do óleo cru extraído do pré-sal, que a Petrobras escolheu como o seu único negócio para satisfazer a rapina dos acionistas.  As receitas da TAG são oriundas de contratos “ship or pay” nos quais o volume disponível de transporte dos dutos é remunerado seja ou não utilizado. Na situação atual, em que a TAG é subsidiária integral da Petrobras, se a Petrobras tiver prejuízo nos contratos com a TAG o lucro fica no sistema Petrobras. Mas, se for privatizada, um eventual prejuízo da Petrobras em relação ao transporte de gás vaza do sistema e vira prejuízo irrecuperável.

Como mostra o especialista Paulo Cesar Ribeiro Lima:

“As receitas da TAG estão garantidas pelos contratos de serviços de transporte, regulados pela ANP, relativos à Malha Nordeste, ao Sistema Gasene, ao Sistema Urucu-Coari-Manaus, ao Sistema Pilar-Ipojuca e ao Sistema Atalaia-Laranjeiras. Em 2016 e 2017, os lucros brutos da TAG foram muito altos, de R$ 5,08 bilhões e R$ 3,66 bilhões, respectivamente. As receitas de serviços são muito maiores que os custos dos serviços prestados. Em 2016, a receita foi de R$ 6,28 bilhões e o custo de apenas R$ 1,2 bilhão.”

A venda em nada aliviará o caixa da Petrobras. No médio e longo prazo, é uma insanidade. Além disso, é ilegal, porque faz letra morta de ordem do Ministro Ricardo Lewandoski, do Supremo Tribunal Federal, nos seguintes termos:

[…] com base no art. 10, § 3º, da Lei 9.968/1999, e no art. 21, V, do RISTF, concedo parcialmente a medida liminar pleiteada, ad referendum do Plenário deste Supremo Tribunal, para, liminarmente, conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 29, caput, XVIII, da Lei 13.303/2016, afirmando que a venda de ações de empresas públicas, sociedades de economia mista ou de suas subsidiárias ou controladas exige prévia autorização legislativa, sempre que se cuide de alienar o controle acionário, bem como que a dispensa de licitação só pode ser aplicada à venda de ações que não importem na perda de controle acionário de empresas públicas, sociedades de economia mista ou de suas subsidiárias ou controladas.” 

A Petrobras escuda-se num frágil parecer da Advocacia Geral da União que não afasta, nem pode afastar, a prevalência da decisão liminar do Ministro Lewandowki quando, como é o caso, a alienação de participação da Petrobras em subsidiária implicar perda do controle acionário, hipótese em que deve ser precedida de autorização legislativa e de licitação. Mas, como celebrizou o conhecido político, dublê de paladino, que usava toga e agora veste termo de Ministro da Justiça, quando se trata de atender ao interesse estrangeiro contra o interesse nacional, mesmo uma decisão do Supremo “não vem ao caso”.

Quando um ato de autoridade contraria decisão do Supremo o que se pode fazer? Ajuizar reclamação constitucional. É o que foi feito. A reclamação constitucional está nas mãos do Ministro Luiz Edson Fachin (ah! O Ministro Luiz Edson Fachin!) já há mais tempo do que o interesse nacional suporta. Enquanto isso, o Brasil sangra.

Voltemos aos resultados da Petrobras. Em 2018, o Brasil continuou na sua trajetória de grande exportador líquido de petróleo. Vendemos ao exterior 650 mil barris equivalentes por dia. Por quê? Porque foram paralisados os nossos investimentos em refino. Estamos patinando na desindustrialização acelerada e criminosa pois, desde Geisel com o segundo II PND – Plano Nacional de Desenvolvimento –,  não temos rumo, estamos sem direção.

Comemorar os números da Petrobras em 2018, como faz o impostor Castello Branco e a mídia acanalhada, é como se na  primeira metade do século XVIII, os brasileiros das Geraes, ao invés de conspirarem contra a rapina da Coroa na Inconfidência Mineira, lançassem-se à rua em frenética dança carnavalesca e de ébria alegria ao saber que aumentara a arrecadação do Tesouro Real com a exploração de ouro na colônia e que a cruel derrama havia sido um exultoso sucesso.

Comemorar os recordes de exportação de óleo cru, fruto do início da exploração do pré-sal, enquanto desde o golpe aumenta na mesma proporção a importação de gasolina e diesel é a mesma coisa. É mentalidade de servidão colonialista. São as malditas perdas internacionais que denunciava o cada mais atual e imprescindível Brizola. É a dominação imperialista reinando soberana na cabeça dos brasileiros pela ação deletéria e bandida da mídia vassala.

E o Ministro Fachin (Ah! O Ministro Fachin!), o que pode fazer? Que tal julgar? Que tal decidir rapidamente a reclamação constitucional contra o desrespeito da Petrobras à decisão clara e límpida do Ministro Lewandoski na ADI 5624/MC DF e botar um garrote ao menos nesta sangria da entrega da TAG. Para ele, é uma canetada. Para o Brasil é uma esperança de que ainda haja juízes na República. Enquanto Fachin tarda (e claudica?), o Brasil sangra.

*Agradeço aos companheiros Paulo Cesar Ribeiro Lima, Felipe Coutinho, Pedro Celestino, Romeu Olmar Klich, Gustavo Antonio Galvão dos Santos pela leitura e comentários ao rascunho do artigo.

[1] Nas suas palavras:

“A cotação do real, em relação ao dólar, média anual de 2017 foi de 3,19, em 2018 o real se desvalorizou para R$ 3,65 / US$. O resultado da companhia é melhor entendido a luz da sua geração de caixa, em 2018 a companhia gerou US$ 31,5 bilhões (EBITDA ajustado). O resultado está alinhado ao desempenho histórico da Petrobras que de 2011 a 2017 gerou anualmente caixa entre 24,3 e US$ 42,0 bilhões, em valores corrigidos para 2018.

O lucro líquido é consequência da menor incidência das reavaliações de ativos, com débitos contábeis, por imparidade (impairment), da redução do investimento anual e da redução das reservas em caixa para o exercício de 2018. Entre 2009 e 2014 o investimento anual médio foi de US$ 48,7 bilhões, em valores atualizados. Enquanto em 2018 foi de apenas US$ 13,5 bilhões, montante de apenas 28% em relação ao investimento médio de 2009 a 2014.

Os principais fatores que determinaram o lucro líquido de 2018 não são, portanto, resultado do mérito da atual administração da companhia. São derivados da capacidade de geração de caixa da Petrobras, da decisão de se reduzir drasticamente os investimentos, além de aspectos conjunturais de natureza contábil.”