Getúlio Vargas e a criação da identidade nacional do Brasil

Getulio Vargas e a criação da identidade nacional do Brasil
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Getúlio Vargas é o maior estadista do Brasil – ao lado de José Bonifácio, Patriarca da Independência – não “apenas” porque criou os direitos sociais, Petrobrás, Vale do Rio Doce, CSN, Cosipa, IBGE etc.

Mais do que tudo isso, e exatamente para conseguir realizar tudo isso, ele criou uma política verdadeiramente nacional-brasileira, pondo fim ao regionalismo centrífugo da Primeira República – que, por sua vez, havia substituído o simulacro de parlamentarismo britânico que foi o Segundo Império – e massacrando as três ideologias importadas que ameaçavam a unidade, a coesão e a soberania do país: o liberalismo, em 1932, o comunismo, em 1935, e o fascismo, em 1938, incorporando os eventuais quadros patrióticos de todos eles, separando o trigo do joio e impedindo que fossem desperdiçados em más companhias, o que mostra a magnanimidade que lhe era característica.

A nacionalização da política ocorreu juntamente com a nacionalização da identidade. O Brasil deixou de se ver como “Europa tropical” e passou a se entender como civilização original a partir dos elementos populares mais elevados, institucionalizando o nacionalismo modernista dos anos 20. A Era Vargas, em particular o Estado Novo, introduziu a categoria de “heróis da Pátria”, até então inexistente, e criou a imagem do Brasil como país do futuro, do samba, do carnaval e do futebol, de um povo mestiço, alegre e ordeiro “que canta e trabalha”.

Evidentemente que Getúlio não fez nada disso sozinho. A Era Vargas foi a culminância de um processo de abrasileiramento do Brasil em curso desde a Guerra do Paraguai e que já havia consagrado a República. O Brasil de Getúlio também foi o Brasil de empresários como Guilherme Guinle e Roberto Simonsen, de militares como Góes Monteiro e Horta Barbosa, de intelectuais como Oliveira Vianna e Cassiano Ricardo, de artistas como Villa-Lobos e Carlos Galhardo. O gigantismo de Getúlio foi a expressão presidencial do gigantismo que permeava todos os outros setores da nacionalidade.

Hoje somos materialmente um país muitíssimo mais rico e mais estruturado do que naquela época, devido às dinâmicas desenvolvimentistas ali iniciadas, mas, política e espiritualmente, o Brasil desabou, o que está levando a uma rápida deterioração da base material construída. As razões para isso são muito complexas e acredito que só poderemos ter uma visão mais nítida daqui algumas décadas, mas me parece claro que o estrago começou com a conversa fiada da “modernização”, na virada dos anos 80 para os 90, que significou justamente desnacionalizar a política e desbrasileirizar o Brasil. No nosso Adeus, Getúlio, em vez das prometidas Ferraris, entraram fuzis e crack; em vez de virarmos Primeiro Mundo, estamos caindo para abaixo da África; em vez de gente fina, elegante e sincera, estamos nos tornando gente triste, cansada e narcotizada.