Por Vina Guerrero – Lembro da minha avó me levando para fazer natação no Complexo Esportivo do Ibirapuera, isso lá no final dos anos 80, início dos 90. Não raro saíamos da piscina e caminhávamos até o “ginásio grande” para ver o Holiday On Ice, com direito a apresentação de uma equipe de patinadores fantasiados que vinham todo ano para o país. Bons tempos!
Soube há pouco, motivo dessa escrita, que o Conselho da Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico do estado de São Paulo (Condephaat) negou o tombamento do Complexo e que João Dória, não perdendo tempo, entregou projeto para a concessão (eufemismo para privatização) do mesmo Complexo para a iniciativa privada por 35 anos. Os fatos não me deixam omitir: essa área nunca mais voltará a ser pública após a construção que querem fazer.
As razões da entrega são, supostamente, os 15 milhões gastos anualmente para manter o local, com até 100 mil metros quadrados em uma das áreas mais valorizadas de São Paulo. Entra na conta também a “vontade” de Doria construir uma arena coberta para um público inexato que pode ser de 8 mil a 20 mil lugares. Vale lembrar que o ginásio tem capacidade para pouco mais de 10 mil lugares hoje.
O Complexo, construído em 1957 com base no projeto do arquiteto Ícaro de Castro Mello, conta hoje com diversas piscinas olímpicas, semiolímpicas e rasas (infantis), quadras de tênis e poliesportivas, uma pista de atletismo, um campo para futebol e rúgbi com arquibancadas, alojamentos para diversos atletas, sedes de associações e federações esportivas de 20 modalidades diferentes e dois ginásios, um para esportes em quadra e outro, menor, para artes marciais, ambos com espaços cobertos para o público torcedor. Tudo isso em um terreno gigantesco, além de algumas áreas verdes no terreno que colorem e embelezam o frio cinzento das antigas obras estatais.
O projeto novo já conta com estudo do governo e projeções do que poderá ser construído no local. Serão edificadas duas torres hoteleiras, uma corporativa e um shopping a céu aberto. Apenas 2 mil metros quadrados serão usados para a construção de quatro quadras poliesportivas e uma pista de skate. Apenas 2 mil metros para os esportes, frente ao megalomaníaco projeto imobiliário que custará R$ 242 milhões dos fundos de investimentos. A conta básica demonstra que então, para cada ano de concessão, o vencedor do projeto desembolsará apenas 7 milhões por ano e deverá lucrar muito mais, caso não fosse não entraria na empreitada. Qual é a compensação para a sociedade paulista? Fica a pergunta.
Os atletas residentes nos alojamentos atuais serão enviados para superlotar outras instalações esportivas como a do Butantã e na Água Branca. Esse último está desativado e em reformas há sete anos. É o sucateamento completo do esportismo público paulista/paulistano. Isso, sem contar o despejo das federações esportivas, já carentes de receitas e da demissão de funcionários do complexo, seja na limpeza, na manutenção, zeladoria e segurança, dos técnicos esportivos e suas equipes.
Se realmente fosse um buraco sem fundo dentro do orçamento paulista, um governo sóbrio e cioso da coisa pública levaria projetos para flexibilizar o uso da área como por exemplo a reforma do Ginásio Geraldo José de Almeida para recebimento de uma plateia maior, com direito a áreas comerciais, praça de alimentação, cinemas e teatro, tudo isso organizado comercialmente por um grupo capitalista interessado em sua exploração. Poderia até ser pensada uma área a ser desmembrada para a construção de uma torre e com os proventos dessa parceria o governo poderia pagar toda a manutenção do Complexo e, quem sabe, até revitaliza-lo de uma maneira moderna a que o esporte e a população merecem.
Vejam, o que esse mero sonhador pensa, de maneira razoável para o momento, é a integração entre vontades populares, governamentais e de empresas capitalistas interessadas, mas tenho quase certeza que um hábil administrador público encontraria formas orçamentárias para manter o Complexo totalmente público e não como o que está sendo feito.
Seja na concessão do Pacaembu, na entrega do Autódromo, dos parques públicos, na reforma ridícula do Anhangabaú ou dos estacionamentos de alguns metrôs, os tucanos entregam tudo em nome de sua manutenção no poder.
É imprescindível que tomemos a luta a sério e que, se preciso for, impeçamos e denunciemos a destruição do Complexo, contando com uma rede de solidariedade das pessoas que também não concordam com esse entreguismo barato além da difusão e do espalhamento das informações dessa luta para todas as redes de comunicação, das tradicionais até as redes sociais. É importante lutar, mesmo que seja para perder, o que é quase certo que aconteça. É preciso arrumar forças lá do fundo de nossa alma nacionalista e trabalhista para que os entreguistas não tenham êxito em seus intentos de custear seus planos perversos em troca de tudo que nos significa um mínimo de cidadania.
Por: Vina Guerrero.