As consequências do discurso ecológico nos países pobres

O discurso ecologico e suas consequencias nos paises pobres
Botão Siga o Disparada no Google News

A precupação com o meio ambiente e o futuro do planeta Terra estão entre as mais racionais e mais nobres causas para se combater a ordem dominante nos dias que correm.

No entanto, há, frequentemente, uma variação catastrofista do discurso ecológico que remete não só a profecias escatológicas tão comuns a diversas seitas na história da humanidade, como às vezes soa até mesmo a puro malthusianismo demográfico e ódio ao bem estar da humanidade.

Um dos tantos tagarelas vaidosos das redes sociais de esquerda vem fazendo propaganda da ideia de que é impossível incluir 1,3 bilhões de humanos na “sociedade de consumo”, como forma de crítica ao suposto mito keynesiano do crescimento econômico chinês acelerado. Imagino que em sua cabeça é melhor que a África também continue rural e com mercados internos raquíticos, a fim de manter nosso planeta a salvo.

Não precisa gostar do regime chinês para se espantar com o reacionarismo do argumento. Como tantas vezes, o esquerdismo mais aparentemente “crítico” se confunde com posições direitistas, no caso: esqueçam de melhorar o padrão de vida de todos os bilhões de seres humanos que não têm acesso à eletricidade, eletrodomésticos, internet e outros bens de consumo necessários à vida moderna, dos quais certamente nossos profetas ecológicos não abdicariam em seu dia a dia.

Qual a conclusão política a se tirar de um raciocínio destes? Devemos evitar que pessoas saiam da miséria (o que implica, sim, necessariamente em aumento do consumo de energia e bens de consumo)? Que o mundo em que sonhamos é uma regressão comunitária utópica ao modo de vida rural, uma comuna hippie gigante? Como isso seria feito? É desejável que enquanto europeus e norte-americanos se deliciem com as benesses da modernidade tecnológica, povos não ocidentais tenham de permanecer vivendo em isolamento, sem acesso sequer à infraestrutura urbana mínima?

Este tipo de ideia, vendida como preocupação com o futuro, condena a humanidade a manter todas as suas horríveis desigualdades de acesso a bens de consumo indispensáveis (sim, geladeira, luz elétrica e smartphones não são necessidades supérfluas no mundo atual), e geralmente é proferida por cidadãos que vivem na vida confortável, recheada de gadgets e bugigangas, proporcionada pelo mundo urbano moderno.

A crítica aos excessos do consumismo ocidental, a incrível quantidade de lixo inútil que é produzida para manter os privilégios de uma pequena fração da humanidade, bem como a defesa de mudanças de comportamento em relação a questões como transporte urbano e gasto energético doméstico, é necessária. Ninguém deve acreditar que o padrão de vida da família norte-americana dos anos 50, com casas gigantes e carrões SUVs, é algum modelo. Coisa diferente é essa hipócrita crítica à saída de milhões de pessoas da miséria em nome de uma divindade laica pura– a “Mãe Natureza” — com adornos até marxistas, mas que não passa de uma daquelas variedades reacionárias de socialismo, uma idílica volta ao passado, em relação as quais Marx fazia tanto questão de se diferenciar no Manifesto Comunista.