Os 120 anos de Carlos Drummond de Andrade

Os 120 anos de Carlos Drummond de Andrade
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Por Luiz Campos – Embora seja também muito relevante nas searas da prosa de ficção e da crônica, a reputação de Carlos Drummond de Andrade (nascido em 31 de outubro de 1902, exatamente há 120 anos), mineiro de Itabira do Mato Dentro, se deve à lúcida limpidez de sua poesia, o que de melhor a cultura brasileira produziu no século XX.

Sua obra, nas diversas fases que percorreu, pode ser vista como metáfora dos caminhos da poesia moderna brasileira. Dois elementos saltam aos olhos do leitor que se debruça sobre a arte do poeta mineiro: certo humor presente na observação do cotidiano que muitas vezes deságua na transcendência da realidade diária. O famoso poema “No Meio do Caminho” é um exemplo claríssimo dessa dialética. Em expressões como “no meio do caminho” e “tinha uma pedra”, fatos aparentementes simplórios, as “retinas tão fatigadas” desvelam no simplório a fatalidade da natureza humana. No meio do caminho sempre há uma pedra. “José”, outra de suas obras mais famosas, também se equilibra nessa dualidade entre jovialidade e existencialismo.

Mais tarde em sua obra surge a temática política e social, porém abordada de modo sereno, demonstrando outras sendas que eventualmente também podem surgir no cotidiano. Um Drummond engajado transforma verso em arma que jamais perde o lirismo e a transcendentalidade. Obras como “Morte do Leiteiro” são excelentes exemplos dessa fase.

Numa fase posterior, o poeta abandona seu cotidianismo em busca de certo elemento épico camoniano imerso em emotividade. Drummond busca uma cosmovisão em que o inescrutável e o mistério são parte do contingente. Entretanto, A busca transcendental retorna transmutada num enternecimento íntimo que o mineiro tenta em vão abrandar. Em obras como “Carta”, Drummond derrama um emotivo torrente de profunda privança. De certa forma, é fechado o ciclo de sua poesia e de sua própria obra, repleta daquela ternura sôfrega de plenitude.

“É quando, ao despertar, revejo a um canto
a noite acumulada de meus dias,
e sinto que estou vivo, e que não sonho.”

Ao longo de uma carreira de mais de cinco décadas, Carlos Drummond de Andrade primou pelo alto nível de inventividade e expressão. Expressão maior de nossa modernidade literária, o porte de sua obra, e o inalterável esmero na forma, transformaram o mineiro em modelo de qualidade para compreendermos a lírica brasileira.

Por Luiz Campos

Publicado pela Frente Sol da Pátria

Os 120 anos de Carlos Drummond de Andrade