Uma coisa continua a me impressionar nessa sequência de vários anos que une política e criminalidade no Brasil: o amadorismo dos criminosos.
O tal capitão Adriano era tido como grande profissional, mas alugou uma casa num resort para passar o aniversário com a mulher e as filhas, que, é claro, estavam sendo monitoradas pela polícia.
Escondido, o Fabrício Queiroz mandava fotos e trocava mensagens fúteis com a mulher, usando telefone celular.
Operações de busca e apreensão em residências continuam a obter provas importantes, inclusive planilhas e listas de contatos, contra pessoas notoriamente investigadas há muito tempo.
Para mim, tudo isso é incompreensível.
Vivi clandestino durante mais de três anos durante a ditadura militar, que contava com um meio de investigação terrivelmente eficaz, a tortura. Um meio que, se fosse usado hoje, como sempre defendeu o nosso presidente, esclareceria qualquer coisa em dez minutos.
Durante os anos de clandestinidade:
* nunca usei telefone nem enviei cartas;
* nunca mantive qualquer contato com família e amigos da época em que tinha vida legal;
* morei em dezenas de lugares diferentes, com nomes diferentes, sempre com boa documentação;
* não anotava absolutamente nenhuma informação; levava tudo na cabeça;
* não conduzia comigo sequer as chaves dos locais onde dormia;
* meus contatos não conheciam a minha identidade, e vice-versa; nos encontrávamos em locais públicos, usando senhas, e nunca sabíamos onde o outro morava; o tempo de tolerância em qualquer encontro marcado era de cinco minutos; o não comparecimento a um encontro (“ponto”) e ao subsequente “ponto de segurança” gerava medidas imediatas de recuo, pelo risco de que alguém tivesse sido preso;
* a volta para casa era feita sempre com manobras de despistamento;
* nunca ficava na rua depois de 22:00 horas;
* nunca bebia bebidas alcoólicas;
Resistimos assim durante anos, em diferentes organizações. Muitos acabaram sendo presos ou mortos, mas quando a ditadura caiu, na década de 1980, bastante coisa ainda funcionava.
Fico impressionado com o amadorismo do crime no Brasil atual.
Por César Benjamin