A soberania da Ucrânia e a neutralidade do Brasil

A soberania da Ucrania e a neutralidade do Brasil
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Por André Luiz Dos Reis – Há três semanas venho dizendo por aqui que o Brasil deve manter uma postura de não-alinhamento ativo e de neutralidade no caso do conflito ucraniano. Então não há razão para surpresa quando afirmo não apoiar a ‘invasão’ à Ucrânia.

Ora, ‘neutralidade’ é exatamente isto: não se apóia nem se condena. Não se apoia porque a soberania de um país foi quebrada por meio da força militar sem que a Rússia tivesse sido diretamente agredida; não se condena porque se entende e se conhece todo o contexto de expansão da OTAN, imperialismo ianque, revoluções coloridas, neonazismo e fascismo ucraniano, bombardeios no Donbass, e tendências multipolares.

Peguem o caso de Celso Amorim, insuspeito de subordinação aos interesses ianques, sabidamente grande defensor da multipolaridade, e um dos consolidadores dos BRICS. Deu entrevistas em cima de entrevistas criticando a OTAN e o hegemonismo norte-americano, a ausência de uma política de segurança comandada pelos próprios europeus e que ouvisse a Rússia. E deu entrevistas em cima de entrevistas criticando duramente a decisão de Putin por agredir militarmente a Ucrânia.

Eu sequer compartilho da visão de Celso Amorim. Eu não acho que o Brasil deva condenar a Rússia pelo conflito. Fui a favor que o país se abstivesse até no documento aprovado na Assembleia Geral da ONU, que a mídia brasileira divulgou como se fosse de condenação à Rússia, mas que em nenhum momento usou a palavra condenação, mas somente ‘lastimou’ a existência do confronto armado. O Brasil deveria se abster, como China e Índia se abstiveram. Note, se abstiveram, porque nem China nem Índia reprovaram a resolução. Os únicos que reprovaram foram Rússia, Bielo-Rússia, Coréia do Norte, Síria e Eritreia.

China e Índia se recusam a implementar as sanções contra a Rússia. Os chineses tem batido forte nos EUA, responsabilizado a OTAN, denunciado a existência de biolaboratórios, denunciado as sanções descabidas e até preparando formas de driblá-las. A Índia quadruplicou sua importação de petróleo russo, negociando diretamente e sem o dólar.

Mas nenhum desses dois países ”apoiou” a agressão da Rússia à Ucrânia.

E não o fazem porque há diferenças em termos de princípios e também na prática das Relações Internacionais quando se adota uma ou outra posição. Diferente do que alguns afoitos pensam, ”não dá na mesma”, nem se está dizendo a mesma coisa quando se toma uma ou outra escolha diante dos fatos.

Então, é isso: o Brasil NÃO DEVE apoiar a agressão russa à Ucrânia. Nem mesmo por ”questões humanitárias”. Anexação da Ucrânia pela Rússia, então, nem pensar. E, ao mesmo tempo, deve denunciar a OTAN, denunciar o neonazismo e os crimes no Donbass, acusar Kiev pelo não cumprimento dos Protocolos de Minsk [que garantiam grande autonomia para as regiões ‘separatistas], se recusar a aderir às sanções, apoiar uma nova comunidade de segurança na Europa, apoiar a União Eurasiática, a multipolaridade etc.

Esta é a postura mais responsável e sólida para o Brasil nesta situação. Que, obviamente, não tem nada a ver com ”porra-louquices” erísticas de ”glorificação da guerra pela guerra” que porventura alguém deseje adotar.

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Caso Putin esteja mentindo e parta de fato pra anexar mais territórios ucranianos, o Brasil deveria criticar a iniciativa de forma contundente. As grandes potências não podem ter aval para redesenhar o território alheio segundo suas próprias conveniências. E o perigo de que isto venha a acontecer por aqui [por parte de EUA e/ou França] deveria estreitar as relações de amizade e integração [econômica e militar] na América do Sul.

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Dmytrov Novikov, vice presidente da comissão de relações exteriores da Duma, afirmou hoje que a Rússia vai ”desmilitarizar” a Ucrânia até maio [!!!], e depois vai começar a “desnazificação”. Evidente que a Rússia não aguenta financiar a guerra por tanto tempo, mas o recado é claro: os russos estão mentindo na cara dura nas mesas de negociação. Vão engolir boa parte do território ucraniano.

Por André Luiz Dos Reis