O papel de um projeto nacional de desenvolvimento no mundo LGBTQIA+

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Às vésperas de junho, o mês da diversidade – em que celebramos o dia internacional do orgulho LGBTQIA+ – volta-se ao centro do debate o papel que a sociedade e o Estado tem em criar formas de dirimir o preconceito e auxiliar estruturalmente a comunidade queer (por queer, entende-se todas as letras da sigla), proporcionando maior inclusão na educação, emprego e ocupação de espaços de poder.

Sempre que falamos sobre a causa LGBTQIA+ e sobre a luta constante pela visibilidade e participação, nosso discurso é recebido logo de início como simplesmente identitário. É importante que se faça claro que o acesso da nossa comunidade na sociedade civil não deve ser encarado dessa forma. Na verdade, existe uma questão estrutural muito forte que precisa ser solucionada para que possamos emergir e ocupar nossos espaços com dignidade.

É precisamente um projeto nacional de desenvolvimento que pode trazer as soluções para os problemas que colaboram para a marginalização de pessoas queer em todos os níveis que buscamos estar presentes. Um projeto de desenvolvimento para uma nação, que seja sério e preocupado com as mazelas que afligem a nossa população, tem como ponto focal a busca por uma forma de reter o capital que tem se esvaído do país e melhor aproveitá-lo internamente, com investimento nacional para a formação de indústrias e desenvolvimento da nossa educação, saúde, cultura e de outras áreas da nossa sociedade.

E pode ser que nesse momento você pense: “Tá, mas e como isso ajuda a população LGBT?” Em tudo! E digo isso por acreditar que a ideia embrionária de um projeto de desenvolvimento pode e deve ser adaptada para diferentes rostos da sociedade, entre eles, a nossa comunidade. E exponho isso montando uma base de três pontos essenciais para desenvolvimento de políticas públicas que podem nos beneficiar: Educação, Trabalho e Cultura.

Para a educação, acredito num plano de remodelação da educação nacional que transforme, no nível básico, as crianças e jovens de nosso país em cidadãos de pensamento crítico, e não apenas em máquinas de decorar fórmulas e fatos históricos para utilizar em algumas provas no futuro, e promover, com uma grade de ensino mais humana e menos robótica, o respeito a diversidade, para que forme pessoas capazes de sair da sala de aula sem preconceito e com mais empatia. Paralelamente, é extremamente necessário implementar programas que promovam ensino especializado, principalmente para travestis, que dentro da comunidade, são as que mais sofrem com o preconceito e a falta de oportunidades. É imperioso que o olhar para essas mulheres seja mais intenso, a fim de promover o acolhimento dessa classe com maior celeridade, afinal, o Brasil ainda é o país que mais mata travestis, que tem expectativa de vida de apenas 35 anos, e precisam desses acessos para nutrir seus sonhos e esperanças.

O fortalecimento da educação para a população queer permite que tenhamos mais pessoas da nossa comunidade aptas a exercerem profissões no mercado de trabalho. Mas que emprego oferece um país com mais de 16 milhões de desempregados em 2021? Os que serão criados pelo desenvolvimento da indústria nacional, e facilitados pela reestruturação econômica que dará ao pequeno e médio empresário maior capacidade de empreender com melhor saúde financeira. O ensino profissionalizante deve ser um caminho facilitador do acesso para o mercado de trabalho formal, e é extremamente necessário que existam políticas de inserção da população LGBTQIA+ com formação nos novos postos criados por esse aquecimento industrial.

Quanto à cultura, o plano nacional de desenvolvimento versa sobre a necessidade de fomento da classe artística e de projetos que mostrem a sociedade como ela é de verdade, através de peças, filmes, programas de TV e rádio, entre tantos outros formatos. E nesse prisma que nossa comunidade tem maior destaque, afinal, somos uma máquina de produção de conteúdo e cultura de qualidade e que desperta interesse em diversas idades e camadas sociais, e poder canalizar essa gama criativa em projetos que possam mostrar a realidade da população queer para mais pessoas, é uma forma de abrir as portas do armário, mostrar quem somos, de onde viemos, e que apenas queremos ocupar nossos espaços, com os mesmos direitos, sem nenhum privilégio que alguém cis-hétero não tenha.

É preciso pensar além do discurso identitário, que, mesmo necessário, não se sustenta sozinho em um país que agride de forma violenta um LGBT a cada hora. É urgente pensar em formas de soluções para as problemáticas estruturais, com foco para a comunidade queer, a fim de resguardar a esperança de geração de oportunidades para a nossa população. E trazer essa solução em voga através dos pilares que já estão desenhados, dentro de um plano para desenvolver nosso país e nosso povo, mas que precisa ser visto pelo olhar queer e desenvolvido para a comunidade LGBT, é uma forma inteligente de desenvolver um movimento para levar a causa além do discurso, que comece um debate amplo, visando o apoio desse projeto para que ele tenha o DNA queer, que promova a igualdade, a diversidade, e que garanta as oportunidades para gays, lésbicas, bis, travestis, queers, intersexos, agêneros, e todos os demais.

Afinal, o dever da esperança de cada letra dessa sigla é responsabilidade do Estado, e a busca por atender as esperanças da comunidade é um compromisso de cada um de nós.