Por que a privatização dos Correios não é uma boa ideia

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Por Ana Neves e Habib Jarrouge – Apesar da intensa propaganda negativa, os Correios são lucrativos e prestam diversos serviços aos brasileiros, chegando onde ninguém mais chega. Única empresa presente em todos os municípios do país, os Correios garantem integração nacional e cidadania a milhões de pessoas. Segunda maior empregadora do país (atrás somente do Banco do Brasil), com mais de 100 mil funcionários formais em 2021, geram outras centenas de milhares de empregos indiretos. Mais do que dar lucros (como os R$12 bi dos últimos 20 anos, com 73% repassados à União), sua função é prestar um serviço social, o que vêm fazendo com competência ao longo de décadas e décadas (apesar dos esforços governamentais para seu sucateamento).

Além desses óbvios benefícios à economia e sociedade brasileira, os Correios também se destacam por outros pontos: logística e comunicação digital, possuindo um banco de dados extremamente cobiçado nessa era em que a informação se torna cada vez mais valiosa. Têm dados detalhados sobre compras, hábitos de consumo e características demográficas de milhões de lares e negócios. Têm expertise no deslocamento de toda a sorte de mercadorias, fazendo-as chegar nos lugares de mais difícil acesso (que ainda hoje são negligenciados por seus competidores privados). Têm potencial para se tornarem uma empresa de logística internacional, gerando benefícios para toda a economia. Têm, ainda, compromisso com a inovação e introdução contínua de novas tecnologias.

Por tudo isso, do ponto de vista estratégico e dos interesses nacionais, não faz sentido a privatização dos Correios. “Mas a ideia é torná-lo sociedade de economia mista”, dirão alguns, “com a divisão de propriedade entre setores público e privado”. Não seria esse um bom arranjo? Não, porque (dentre outros problemas) a esse tipo de empresa é inerente um conflito fundamental: a oposição entre o interesse público e a busca por maximização de lucros para os acionistas (conflito este que se acentua quando há abertura para investidores estrangeiros). Nesse caso, ainda que o Estado retenha o controle da administração, a história tem nos mostrado que as tensões são muitas vezes resolvidas em prol das demandas privadas (o caso Petrobrás é emblemático, mas não o único).

Se lutamos por um país desenvolvido, moderno e soberano, devemos defender os Correios e mantê-los como empresa estatal pois, antes de tudo, a discussão sobre os Correios é uma discussão sobre direitos, o direito de todos a um serviço postal.

Por: Ana Neves.
Professora, mestre em economia pela UFRJ e pela Universidade de Cambridge.

Habib Jarrouge.
Engenheiro Civil pela UFPR e Vice Diretor do Departamento de Engenharia da Habitat e Infraestrutura do Instituto de Engenharia.