O “perigo comunista” em 1964 era o povo na política

No Rio, o encontro de Carlos Lacerda, Castelo Branco e o general Ernesto Geisel. Fonte: Agência O Globo
No Rio, o encontro de Carlos Lacerda, Castelo Branco e o general Ernesto Geisel. Fonte: Agência O Globo
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As políticas do regime civil-militar [uma terminologia que considero mais apropriada pra se referir ao período] variaram no tempo em diversos âmbitos. Os planos liberais do governo Castelo se tornaram em um projeto nacional desenvolvimentista sob Médici e Geisel. Do mesmo modo, a humilhante americanofilia dos primeiros anos se tornou em uma política externa consciente dos interesses próprios do Brasil em meados dos anos 1970 e que emulava as melhores tendências da política externa independente da década anterior.

Mas em um ponto o regime continuou fiel a seu propósito original: manteve sempre o objetivo de realizar um crescimento e desenvolvimento [seja liberalizante ou nacional-desenvolvimentista] às expensas do trabalhador. O que a classe média tradicional e seus representantes e aliados chamavam de ”perigo comunista” ontem como hoje nada mais é do que a ascensão política e econômica dos setores populares. Qualquer ameaça, ainda que pequena, à estrutura de desigualdade social do país é encarada por essas forças como uma subversão, uma revolta dos escravos que pode coloca fim à civilização cristã, ou como uma onda vermelha que vais nos mergulhar no ateísmo, no materialismo e no marxismo.

O que espantou os militares que apoiaram Vargas durante os anos 1930 e 1940 no processo de desmantelamento do Estado Novo, levando-os a colocar fim ao regime que ajudaram a sustentar por tanto tempo, foi a aproximação de Getúlio com os trabalhadores urbanos no ”queremismo”.

Ainda pior do que medo, há um ódio, uma repulsa crônica da elite social pátria em relação ao povo brasileiro. A entrega do país nas mãos dos ianques é um meio de manter o arcabouço em que se realiza essa repulsa e distanciamento.

O que sempre enfraqueceu os militares nacionalistas diante de seus rivais liberais e internacionalistas no interior das FFAA foi o medo e o ódio á subversão, foi a polarização com o ”populismo”. Foi a recusa em reconhecer a relação entre um líder carismático e a massa como verdadeiro ”poder moderador” de um sistema político em detrimento da ”política” realizada no Clube Militar do Rio de Janeiro. E foi sempre essa a linguagem que permitiu a composição da elite militar com os setores mais canalhas da elite civil brasileira. O velho temor do monstro da lagoa, das ”classes perigosas”, do poder que vem de baixo.

Por André Luiz Dos Reis