Os traders da Faria Lima odeiam os marxistas, mas sabem que a riqueza vem do trabalho

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Por Bruno Machado – O trabalhismo e sua defesa do trabalho frente ao capital é um imperativo fundamental para a busca de uma vida justa dentro do modelo capitalista. Que a riqueza é produzida pelo trabalho, e não pelo capital, é sabido não só pelos marxistas, mas também pela Faria Lima que só nega tal fato por interesse e ideologia.

Em sua obra O Capital, Marx estudou o funcionamento do capitalismo e o conceito de “valor” que o filósofo dividia em valor de uso e valor de troca. Nas trocas capitalistas, é o valor de troca que conta, então passarei a me referir ao valor de troca só como valor. Marx repetidas vezes afirmou que “o preço persegue o valor”. Ou seja, há uma variação de preços dos produtos no tempo – conforme a preferência dos consumidores – mas no longo prazo esses preços chegariam ao valor.

No mercado financeiro, o investimento em ações é dividido em duas escolas: a Fundamentalista e a Técnica (ou Grafista). Vou chamar a segunda de Grafista pois acho o termo mais didático. A análise fundamentalista acredita que se compra uma ação por determinado preço que pode estar abaixo ou acima do valor daquela ação. Warren Buffet, principal nome dessa escola, tem uma famosa frase que diz “preço é o que você paga, valor é o que você recebe”. Já a análise gráfica acredita que o valor é impossível de ser determinado ou quando se consegue, se faz através de informações privilegiadas de dentro de empresas. Os grafistas fazem operações de mais curto prazo usando instrumentos de Elliot e Fibonacci, por exemplo, e tentam prever o movimento das ações que é determinado pelo comportamento em massa dos investidores. Sendo assim, a análise gráfica tenta enxergar nos gráficos os perfis psicológicos dos investidores para ganhar em cima disso.

O economista britânico Alfred Marshall que elaborou o principal manual de economia utilizado na Inglaterra por décadas chegou a conclusão de que os preços tendem aos custos de produção no longo prazo e à preferência dos consumidores no curto prazo, corroborando de certa forma o que os traders das duas escolas de investimentos acreditam e o que Marx já afirmava muito tempo antes.

Mas então, se Marx e os traders sabem que o preço persegue o valor e através de Marx e Marshall sabemos que o valor vem dos custos de produção, de onde vem a riqueza que é produzida, ou seja, como os PIBs dos países sobem, as pessoas ficam mais ricas e as bolsas de valores também sobem com o tempo? Se os custos de produção são insumos e trabalho (ou, em outras palavras, capital e trabalho) e insumos são dados pela natureza ou retirados e transformados pelo trabalho humano em novos insumos, toda riqueza a mais gerada na sociedade vem do trabalho humano. E isso já era sabido antes mesmo de Karl Marx, por Adam Smith que criou a chama teoria do valor-trabalho.

A reflexão que fica disso tudo é: será que os traders da Bolsa de Valores, e mesmo CEOs de multinacionais que ganham salários milionários, recebem a quantidade de riqueza justa pelo trabalho que eles exercem escolhendo ações? O mercado financeiro tem uma papel fundamental na alocação de recursos no capitalismo (que no limite significa alocação de trabalho), e não discordo de que esse tipo de trabalho mereça o direito a uma quantidade generosa de riqueza socialmente produzida. Mas ainda assim, será que um trader que ganha bilhões por ano em seu trabalho é tão bom nisso e tão importante para a sociedade para que tenha direito a receber uma parte tão grande da riqueza gerada pelo trabalho humano no mundo inteiro? É evidente que há uma distorção grande e injusta, e por isso os impostos são fundamentais para reduzir essas injustiças inerentes ao capitalismo.

Por: Bruno Machado.