Novo Ministro da Defesa lança nota sobre 1964 muito mais moderada que a do ano passado

Novo Ministro da Defesa lança nota sobre 1964 muito mais moderada que a do ano passado
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Por Carlos Duarte – Contra todas as expectativas, após os conturbados eventos do último dia, com a substituição do Ministro da Defesa e de todo o comando das Forças Armadas, às vésperas do 1º de abril – que se usou “celebrar” na caserna no 31 de março, para evitar o ridículo de terem que lembrar anualmente que o chamado “golpe patriótico” depôs o governo nacionalista de Jango no Dia da Mentira –, o novo Ministro, Braga Netto, lançou uma moderada Ordem do Dia sobre 1964.

Na verdade, mais que moderada. A curta nota traz um tom conciliatório, colocando a culpa da radicalização do período na Guerra Fria e dizendo que os militares não deram o golpe sozinhos, mas “com amplo apoio da imprensa, de lideranças políticas, das igrejas, do segmento empresarial, de diversos setores da sociedade organizada”.

Depois do golpe, articulado por todos esses grupos, segundo a queixa devidamente registrada na nota de hoje, os demais agentes deixaram as coadjuvantes Forças Armadas sós na hora de “assumir a responsabilidade de pacificar o País”.

A moderação da nota ainda ganha mais relevo se comparada à Ordem do Dia publicada em 31 de março de 2020, pelo agora ex-ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e assinada também pelos então comandantes do Exército, Edson Leal Pujol, Marinha, Ilques Barbosa Junior, e Aeronáutica, Antônio Bermudez. Na do ano passado, já no primeiro parágrafo, se afirmava que “o Movimento de 1964 é um marco para a democracia brasileira. O Brasil reagiu com determinação às ameaças que se formavam àquela época.”

De “heróis da democracia contra o comunismo” à “abandonados pelos outros conspiradores que agora nos acusam”, as Forças Armadas continuam a digerir o indigesto evento de 1964, que aprofundou a dependência do Brasil ao interromper o processo nacional-reformista que estava em curso.

Na Ordem do Dia publicada hoje e assinada apenas pelo novo Ministro da Defesa, Walter Souza Braga Netto, após ressaltar que “a Lei da Anistia, aprovada pelo Congresso Nacional, consolidou um amplo pacto de pacificação a partir das convergências próprias da democracia”, fruto de uma “uma transição sólida, enriquecida com a maturidade do aprendizado coletivo”, concluiu o Ministro, com evasiva obviedade, que: “O movimento de 1964 é parte da trajetória histórica do Brasil. Assim devem ser compreendidos e celebrados os acontecimentos daquele 31 de março.”

Mas qual evento da história do Brasil não é “parte da trajetória histórica do Brasil”?

Vindo das Forças Armadas, nada pode ser mais eloquente que o desejo de se diluírem na história brasileira, transformando em pé de página um capítulo tão fundamental para se compreender os rumos seguidos pelo país desde o lamentável 1º de abril de 1964.

Por Carlos Duarte, jornalista.


Segue a Ordem do Dia:

MINISTÉRIO DA DEFESA
Ordem do Dia Alusiva ao 31 de março de 1964

Brasília, DF, 31 de março de 2021

Eventos ocorridos há 57 anos, assim como todo acontecimento histórico, só podem ser compreendidos a partir do contexto da época.

O século XX foi marcado por dois grandes conflitos bélicos mundiais e pela expansão de ideologias totalitárias, com importantes repercussões em todos os países.

Ao fim da Segunda Guerra Mundial, o mundo, contando com a significativa participação do Brasil, havia derrotado o nazi-fascismo. O mapa geopolítico internacional foi reconfigurado e novos vetores de força disputavam espaço e influência.

A Guerra Fria envolveu a América Latina, trazendo ao Brasil um cenário de inseguranças com grave instabilidade política, social e econômica. Havia ameaça real à paz e à democracia.

Os brasileiros perceberam a emergência e se movimentaram nas ruas, com amplo apoio da imprensa, de lideranças políticas, das igrejas, do segmento empresarial, de diversos setores da sociedade organizada e das Forças Armadas, interrompendo a escalada conflitiva, resultando no chamado movimento de 31 de março de 1964.

As Forças Armadas acabaram assumindo a responsabilidade de pacificar o País, enfrentando os desgastes para reorganizá-lo e garantir as liberdades democráticas que hoje desfrutamos.

Em 1979, a Lei da Anistia, aprovada pelo Congresso Nacional, consolidou um amplo pacto de pacificação a partir das convergências próprias da democracia. Foi uma transição sólida, enriquecida com a maturidade do aprendizado coletivo. O País multiplicou suas capacidades e mudou de estatura.

O cenário geopolítico atual apresenta novos desafios, como questões ambientais, ameaças cibernéticas, segurança alimentar e pandemias. As Forças Armadas estão presentes, na linha de frente, protegendo a população.

A Marinha, o Exército e a Força Aérea acompanham as mudanças, conscientes de sua missão constitucional de defender a Pátria, garantir os Poderes constitucionais, e seguros de que a harmonia e o equilíbrio entre esses Poderes preservarão a paz e a estabilidade em nosso País.

O movimento de 1964 é parte da trajetória histórica do Brasil. Assim devem ser compreendidos e celebrados os acontecimentos daquele 31 de março.

WALTER SOUZA BRAGA NETTO
Ministro de Estado da Defesa

Novo Ministro da Defesa lança nota sobre 1964 muito mais moderada que a do ano passado