Por que a Austrália inspirou Brizola

Por que a Australia inspirou Brizola

Na eleição de 1989, Brizola chamou a atenção citando como referência do seu plano de governo as políticas trabalhistas da Austrália. Até hoje isso desperta curiosidade uma vez que o debate público brasileiro se dedica muito a puxar o saco ou demonizar os exemplos estrangeiros, sem se dar ao trabalho de compreendê-los em seus contextos específicos.

A simpatia do Velho Briza pela Austrália foi facilitada pelo fato desse país ter tido o primeiro governo trabalhista do mundo, em 1904, e também pelas políticas de desenvolvimento agrário e social da Austrália já terem sido utilizadas como referência por Alberto Torres, um autor muito caro aos nacionalistas brasileiros de todas as matizes – Barbosa Lima Sobrinho, mais à esquerda na segunda metade de sua vida, escreveu uma ótima biografia dele, e Geisel, em sua última entrevista, citou-o como leitura de cabeceira.

Mas, mais especificamente, o que despertou a admiração do Brizola foi o fato da Austrália, desde aquela época, ter colocado em prática uma política trabalhista e industrial muito peculiar e bem sucedida. O governo aumentava a proteção alfandegária às indústrias nacionais em troca delas empregarem mais trabalhadores, aumentarem seus salários e benefícios e aceitarem o direito deles de se sindicalizarem. Além disso, a proteção a cada setor industrial aumentaria na medida em que eles acertassem com os sindicatos a geração de mais empregos, salários e assistências.

Foi uma política muito interessante e que, junto a outros aspectos, como uma estrutura agrária moderna e democrática e a existência de serviços públicos bastante avançados, consolidou a Austrália como um dos melhores países do mundo para se viver ao longo do século XX. A política trabalhista australiana antecipou os amplos acordos nacionais de classe que se proliferaram na Europa a partir da Crise de 1929 e da II Guerra Mundial e criaram as bases das social-democracias, como o Grande Acordo da Noruega de 1935, o Acordo de Saltsjöbaden na Suécia de 1938, o modelo pôlder holandês do pós-guerra e o Congresso de Bad Godesberg na Alemanha Ocidental de 1959.

Quando Brizola anunciou o exemplo australiano como referência, a Austrália desmantelava essa mesma política, pois, nos anos 80 e 90, as relações de trabalho naquele país passaram por uma profunda liberalização e mercantilização, e, também, várias políticas protecionistas não se tornaram mais possíveis devido a novos acordos comerciais internacionais, à reformulação das regras da OCDE e à criação da OMC em 1995. O neoliberalismo também chegou para eles.

Existe uma descrição curta mas bem sucinta dessa política citada pelo Brizola no capítulo sobre a Austrália no livro A Identidade das Nações – Uma Breve História, organizado por Peter Furtado e publicado no Brasil pelo SESC em 2019.

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