O Palmeiras foi criado pelo racismo

Para aflorar um pouco o ódio antes do Choque-Rei de logo mais, compartilhamos com vocês um fato que poucos conhecem. Muitos nos acusam de termos uma implicância pessoal e gratuita contra o Palmeiras, o que exige correção: a implicância não é pessoal, mas político-histórica, e está bem longe de ser gratuita.

Inclusive, se pudéssemos escolher um rival para esculacharmos constantemente, este seria o Corinthians, que historicamente nos dá muito mais trabalho dentro de campo, mas, feliz ou infelizmente, os alvinegros não nos dão munição.

Bom, nosso bonde mantém um grupo de estudos permanente, onde compartilhamos e analisamos livros, artigos, estatísticas históricas etc, cujos focos são o marxismo-leninismo e a história política no futebol. Temos muito material sobre o Palmeiras para justificar nosso ódio, mas este aqui conseguiu nos surpreender.

Numa das nossas reuniões alguém trouxe, para apreciação, a pesquisa “Cego é aquele que só vê a bola: o futebol em São Paulo e a formação das principais equipes paulistanas: S.C. Corinthians Paulista, S. E. Palmeiras e São Paulo F.C. (1894-1942)”, do historiador João Paulo Streapco. Nela ele analisou a formação dos três clubes e os momentos históricos entre os anos de 1894, quando o inglês Charles Miller introduziu o futebol no país, até 1942, data da alteração do nome Palestra Itália para Sociedade Esportiva Palmeiras. O estudo de mestrado, orientado pela professora Raquel Glezer, foi apresentado na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.

Já demonstramos aqui que o Palestra Itália foi fundado por operários italianos racistas e subservientes à burguesia italiana estabelecida em São Paulo, que não queriam se misturar aos operários brasileiros, principalmente aos pretos, que compunham o Corinthians — não só em campo, os palestrinos também eram racistas contra a torcida — [https://bit.ly/2VsNKK5]. Ainda assim, este trecho da pesquisa do professor Streapco nos causou assombro:

“[…] Aliás, o então Palestra Itália NÃO ADMITIA JOGADORES NEGROS NO TIME. O primeiro deles foi Og Moreira, NO INÍCIO DOS ANOS 1940. O primeiro a admitir um jogador negro entre os três paulistanos foi o Corinthians. O São Paulo nunca teve qualquer tipo de restrição.” [https://bit.ly/2D0UbMY]

Mesmo para nós, que odiamos o Palmeiras, e apesar da alta credibilidade da pesquisa, custamos a crer na informação. Como um clube fundado em 1914, cuja parcela de esquerda da torcida exalta a participação na Greve Geral de 1917, só foi aceitar seu primeiro negro na década de 1940? Seriam quase TRINTA ANOS de racismo. Ficamos atônitos.

Decidimos aprofundar a pesquisa (ninguém aqui é leviano e detestamos propagar mentiras), mas não foi difícil. Na página OFICIAL da Sociedade Esportiva Palmeiras consta, com todas as letras, na seção “Ídolos”: “OG MOREIRA, PRIMEIRO NEGRO A ATUAR COM A CAMISA DO CLUBE, EM 1942 […].” [http://www.palmeiras.com.br/historia/idolos/523]

Tá aí o clube “fundado por operários anarquistas” (que vieram para o Brasil “fugidos do fascismo” uma década antes de Mussolini fundar o Fasci Italiani di Combatimento e adotaram o brasão da nobre Casa di Savoia como distintivo, uma escolha pra lá de “anarquista”, tão lógica quanto o Autônomos FC ostentar em seu uniforme o brasão dos Orléans e Bragança).

O Palestra é de 1914, mesmo ano do início da Primeira Guerra Mundial, que terminou no final de 1918. O Corinthians, fundado em 1910, teve o membro-fundador Joaquim Ambrósio, filho de pai negro e mãe indígena, atuando como atleta em sua primeira partida oficial e contratou seu primeiro atleta negro no início de 1919, o atacante Asdrúbal Cunha, o “Bingo”, mas antes disso, em 1914, já havia tentado inscrever o atleta negro Davi, recusado pela Liga Paulista de Futebol. O nazismo ascendeu na Alemanha com suas teorias pseudocientíficas eugenistas na década de 1920 e a Segunda Guerra Mundial foi deflagrada em 1939 e terminou em 1945, nesse meio tempo, o São Paulo FC foi fundado em 1930 e refundado em 1935, com a participação da comunidade negra paulistana e sem nenhuma restrição a atletas negros, inclusive mulheres, ou seja: o Palestra Itália passou por duas Guerras Mundiais, pela ascensão e queda do nazifascismo e pelo acolhimento de negros nos seus dois maiores rivais locais antes de tomar vergonha na cara e contratar Og Moreira do Fluminense, e não por ter-se tornado menos racista, mas porque estava engajado na campanha de mostrar-se “brasileiro”, ainda receoso pelas ameaças de perda de patrimônio sofridas nos anos anteriores por associações ao Eixo nazifascista.

Como Og Moreira foi apresentado após a mudança do nome, o Palestra Itália passou por toda a sua existência, de 1914 a 1942, sem que nenhum atleta negro tenha vestido as suas cores.

E a ala esquerda da torcida palestrina vem nos dizer que “o fato de Jair Bolsonaro torcer para o Palmeiras desrespeita a história da entidade”? Desrespeita porra nenhuma, totalmente condizente com um político que acha que gente preta deve ser “pesada em arrobas”.

Aquela grotesca festa que vimos na entrega da taça do Brasileirão do ano passado tem raízes históricas.

Agora já podem nos acusar de “clubistas”, recurso único, já que não dá para brigar com os fatos (que nunca são mencionados ou esclarecidos, apenas negados). E não venham com justificativa de “normal num clube de colônia” porque Portuguesa, Juventus e Jabaquara (fundado Hespanha Foot Ball Club, clube da colônia espanhola de Santos) aceitaram negros bem antes e o Palestra aceitava atletas que não fossem italianos, desde que fossem brancos.

Se fossemos torcedores da agremiação, trabalharíamos incessantemente esse passado, num gigantesco processo de autocrítica com o intuito de construir um novo perfil e uma nova imagem, porém, como não somos, não temos nenhum compromisso com a defesa. Nosso função como rivais é jogarmos na cara, para que não se repita.

Deixamos o revisionismo histórico para a Puma, o Rincón Sapiência e o Usain Bolt.

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