O Trabalhismo de Alfredo Sirkis

Na data de ontem, 10 de julho de 2020, fui surpreendido com a notícia da morte em um desastre de automóvel do Alfredo Sirkis.

Nada existe mais certo nesta vida do que a morte. Mesmo assim, sempre nos surpreendemos quando ela ocorre sem um rito de passagem: o abrupto nos choca.

Conheci o Sirkis quando tinha 17 anos. Estava fazendo o pré-vestibular para Direito e já militava no movimento estudantil secundarista. Mesmo sendo uma base da Ação Popular Marxista-Leninista, era simpático e curioso quanto ao trabalhismo e ao brizolismo, pelas histórias que ouvia em casa. E tinha o Sirkis como um ídolo, principalmente depois que li o seu livro “Os Carbonários”.

Nesse momento, ano de 1980, o então chamado PTB de Brizola, tinha uma pequena sala na Rua Álvaro Alvim. No entanto, na Rua Sete de Setembro nº 171, tínhamos o Centro de Mobilização Trabalhista que reunia a chamada esquerda trabalhista. E lá conheci o Sirkis.

Ele junto com Carlos Minc, Sidney de Miguel e outros, faziam parte do grupo que nos anos 60/70 tinham participado da luta armada e foram para o exílio. Essa experiência europeia junto aos partidos social-democratas, fez com que trouxessem ideias que para nós eram novas e até mesmo exóticas: defesa do meio ambiente, liberação da maconha, defesa dos direitos dos homossexuais, democracia como valor universal, críticas à União Soviética e etc.

Sirkis simbolizava essas ideais e representava o novo para o próprio Brizola. Era aquele que se dizia seria o seu herdeiro, o elo entre o passado, presente e o futuro. A possibilidade de renovação do trabalhismo junto à juventude, que pouco sabia da história desse partido e que para ela pouco representava.

Mas a convivência entre uma esquerda renovadora que tinha se criado fora do país e uma outra esquerda, ortodoxa, que atuou durante todo o tempo nas trincheiras dentro do país, obviamente havia um choque. E isso entre nós mesmos do Centro de Mobilização Trabalhista! Logo, tínhamos uma divisão entre sociais-democratas e comunistas. E Sirkis estava nesse primeiro grupo.

Mas na verdade havia um conflito entre uma prática renovadora e democrática e aquela mais antiga, mais eleitoral, que era dos velhos trabalhistas. E isso criava um conflito com o próprio Brizola, que depois da perda da sigla, tinha que viabilizar eleitoralmente o projeto com uma sigla desconhecida.

E o conflito ocorreu na primeira reunião do Diretório Regional do PDT do Rio de Janeiro. Na sua composição o Centro estava representado por Lysâneas Maciel, Brandão Monteiro, Carmem Cynira, Alfredo Sirkis, Luiz Carlos Moreira, Antônio César do Amaral e eu, Marcos Neves. A reunião foi na sede do Sindicato do Jornalistas do Rio de Janeiro, que ficava no prédio da Rua Evaristo da Veiga. Essa reunião começou às 14 horas e só terminou às 2 horas da manhã. Brizola defendeu na reunião que a executiva do partido fosse composta por um conselho de vice-presidentes. Através do Brandão Monteiro, protestamos, pois considerávamos que isso tirava a funcionalidade do partido e impedia Lysâneas Maciel ser de fato o vice-presidente do partido. Brandão afirmou que isso tornava o partido balofo. Brizola furioso, deixa a mesa para dar um tapa no Brandão. Começou um tumulto. Brizola é contido e Brandão sai da sala. A proposta é colocada em votação. Votaram contra a proposta do Brizola, Lysâneas Maciel, Luiz Carlos Moreira, Antônio César do Amaral, eu e Alfredo Sirkis. Cinco votos contra. Devidamente consignados em ata.

Depois desse episódio, Alfredo Sirkis saiu do partido. Carlos Minc já tinha saído antes. Lysâneas também saiu.

Não sei qual a razão do Sirkis depois nunca mais colocou em seu currículo político o fato de ter pertencido a formação do trabalhismo brizolista, mesmo sendo um dos signatários da Carta de Lisboa. Pelo menos nos currículos que eu li.

De qualquer forma ele fez parte da minha formação no trabalhismo e ele muito contribuiu para a construção da então Juventude Trabalhista. A sua trajetória depois do trabalhismo foi digna e correta na luta por uma política ambiental e por tudo aquilo que assimilou nas lutas políticas europeias da social-democracia.

Seu nome está na nossa história.

Por Marcos Neves, advogado e consultor legislativo, fundador da Juventude Trabalhista e Socialista do PDT.

Rio de Janeiro, 11 de julho de 2020.

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