Anos antes do Golpe e a Panela de Pressão que caiu no colo de João Goulart

Posse de João Goulart como vice-presidente, Janio Quadros como presidente e à direita o ex-presidente Juscelino Kubitschek. 31 de janeiro de 1961

Posse de João Goulart como vice-presidente, Janio Quadros como presidente e à direita o ex-presidente Juscelino Kubitschek. 31 de janeiro de 1961

Os anos anteriores ao governo de João Goulart, foram marcados pelo aumento do gasto provocado para o desenvolvimento de uma economia que precisava se fortalecer. O Plano de Metas do Governo Juscelino Kubitschek ampliou as condições de desenvolvimento, com programas que buscavam sanar as defasagens e impediam que a economia brasileira pudesse vir a sair do “estrangulamento econômico” que se encontrava, como: as metas enérgicas (carvão, produção e refino de petróleo e ampliação do parque elétrico), aumento das indústrias de produção de bens pesados e no âmbito da construção civil e rodoviário. Contudo, claramente o plano deixa de lado preocupações referentes à educação e a agricultura familiar.

Porém, havia um objetivo a ser realizado, quase pessoal de JK, que estava no interior de seu projeto. A construção de Brasília levaria para o centro do país a modernização, a política e arrastaria consigo as vestigens de um crescimento com baixo nível de financiamento. Diferente de Getúlio Vargas, que, averso ao capital e o crédito estrangeiro, buscou internamente as condições de financiamento, na medida do possível para o desenvolvimento de seus projetos, Juscelino Kubitschek, pega junto ao FMI e ao EXIMBANK quantias que ampliaram as dívidas externas. Brasília é o epicentro do problema inflacionário brasileiro, que se arrastaria por décadas a frente e deixaria para Jango e João Goulart terem que cuidar dessa situação. Um “monstro”, que sai de uma taxa média dos governos JK de 24,7% ao ano, para atingir, nos governos de 1961-1963 a taxa média de 59,1% (VILELA, 2011, p. 28).

Outros fatores se juntariam ao caos pós Juscelino Kubitschek. Em situação de correção dos erros dos anos anteriores, Jânio Quadros, dá início à políticas de controle fiscal. Sem apoio, renuncia a presidência na esperança de conseguir retornar ao cargo nos braços do povo e assim, conseguir aprovar as reformas e as medidas necessárias. Mas a história mostra-se cruel com Jango. Uma economia precisando de reparos, mergulhada no caos político de ter agora um ex-presidente, que após sete meses havia renunciado e seu vice presidente, com o qual havia estado presente na China de Mao Tse-Tung, semanas antes, iria agora assumir a panela de pressão.

João Goulart vive o ápice da ambiguidade política na América Latina, a Guerra Fria fazendo com que países tomassem lado, com o plano Condor batendo as portas, a revolução cubana inflamando o plano político mundial, além da situação interna de cobrança de políticas públicas prometidas por Jango à esquerda e de mais conservadores no país, a Marcha pela Família com Deus pela Liberdade, exemplifica o caos social que o presidente teria que assumir. O mesmo assume um plano ortodoxo, a contenção do gasto público, a estabilidade das contas públicas que as vésperas de março, atingiriam um déficit de US$ 3 bilhões, forte desvalorização cambial, corte de subsídios, política de controle monetário e contenção do salário mínimo. Quanto ao financiamento creditício brasileiro, tem-se aqui uma das defasagens primordiais, que impediram com que o desenvolvimento pudesse tornar-se sólido ao longo dos anos. A ausência de um mercado de capitais robusto e de um sistema monetário mundial pouco interessado no desenvolvimento latino-americano, que enxergava na Europa e Japão pós segunda guerra mundial, uma maneira melhor de investir, tornou o “crédito na praça” escasso, ocasionando praticamente uma única via de financiamento estatal via Banco do Brasil-BNDE.

Entretanto, frente as complicações político-econômicas internas e externas pós JK e Jânio, João Goulart encerra 1961 com um PIB de 8,6%, claramente puxados pelo crescimento dos anos anteriores, porém com sinais claros de retração das contas públicas a frente. Com Celso Furtado no superministério do planejamento e o discurso de conciliação de uma política ortodoxa com desenvolvimento, 1961 já apresentava retração no nível de investimento, um pequeno aumento no setor de exportações e uma dívida externa a tratar que girava em torno de US$ 3,4 bilhões, com desacelerações do PIB dali até 1964.

A crescente insatisfação dos setores produtivos (redução das linhas de crédito e insegurança econômica), de setores conservadores, da esquerda brasileira (que almejava as políticas de base prometidas por Jânio Quadros), o receio da alta cúpula militar com o alinhamento de Goulart (com ressalvas a parte dos setores inferiores do exército, que tinham apreço por ideais revolucionários) e os fatores econômicos citados acima, esquentaram a panela de pressão brasileira para promulgação do golpe que viria a ser dado no dia 31 de março de 1964, que não veio com o discurso de permanência, mas perpetuou-se pelos próximos 21 anos e que teria o seu respiro econômico somente no governo Castello Branco, mas intensivas crises sociais durante sua existência.

Por Emerson Davi Pereira Braz – Economista/PUC-SP/CREDITAS S.A

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