GLAUBER BRAGA: Quem é Carlos Duarte, que escreveu um artigo para me atacar?

Não sei, e já começo por aí. Acho um erro a tentativa de atacar pessoalmente um interlocutor para deslegitimar uma discussão tão importante. É a máxima: Ataquem o carteiro. Mas, afinal, qual era o conteúdo da carta? É sobre esse tema que quero prioritariamente me debruçar nas próximas linhas.

Tudo começou quando expus divergência pública à afirmação de Ciro Gomes de que não existia privatização da água no projeto 4.162/19, em live que ele fez com Eduardo Moreira. Eu, que não tinha falado publicamente no nome de Cid (teria todo o direito de fazê-lo, desde que nos marcos da discussão política), me senti na obrigação de me manifestar. Os principais argumentos, em que contesto a posição política de Ciro, estão dispostos em vídeo, nas minhas redes, já amplamente difundido. E me coloquei à disposição, não só de Ciro e Cid, de vários militantes próximos deles para debater o assunto publicamente. Infelizmente, até o momento em que escrevo esse artigo, nenhum deles aceitou.

Desde então, se formou uma rede pra disseminar a informação de que minha mãe supostamente teria feito a privatização da água no município de Nova Friburgo no período em que foi prefeita. Pura mentira. Importante inclusive trazer o caso do município para essa discussão, pois sempre foi exemplo que dei de como a exploração dos serviços de água e saneamento por corporações internacionais pode ser extremamente prejudicial aos direitos básicos dos moradores de uma cidade. Então, pra quem imaginou que trazer esse debate me obrigaria a um recuo, ledo engano. Vamos politizá-lo.

Em 1999, um prefeito já falecido, chamado Paulo Azevedo, assinou um contrato de 25 anos para entregar a água ao setor privado.

Quem assumiu a prestação foi um grupo controlado por uma empresa dos EUA chamada Earth Tech. O resultado foi desastroso. As contas de água tiveram um aumento astronômico, as pessoas não conseguiram pagar, a empresa disse que a receita estava desequilibrada e entrou na justiça pra não fazer os investimentos pactuados em contrato. Resultado: conta alta e nada de investimentos. Esse foi um exemplo que dei nas várias audiências que participei na câmara quando se discutia a privatização do saneamento. E sempre dizia, os municípios já podem fazer, o que é muito ruim. Mas criar mecanismos que obriguem a entrada do setor privado na exploração é um desastre. Eu chamo isso de privatização e é o que faz o projeto de Bolsonaro votado no Senado. Lembremos, o último texto aprovado é do poder executivo federal.

Mas, voltando ao caso de Friburgo. Depois de anos de uma demanda judicial, houve uma negociação e a demonstração de interesse da empresa dos EUA em entregar a exploração para uma empresa brasileira. Não houve nova concessão. Até porque, como já disse, o contrato assinado em 99 era de 25 anos. Respeito o argumento de quem defende que poderia ser tentada a reestatização. Acontece que, com o desequilíbrio econômico financeiro reconhecido pela administração anterior, a prefeitura era considerada devedora de aproximadamente 70 milhões à empresa estrangeira. Romper o contrato seria correr o risco de perder uma disputa judicial nesses valores para uma cidade com orçamento anual, na época, de aproximadamente 150 milhões.

Conhecer e vivenciar essa realidade só me trouxe mais convicção de que a privatização é um enorme equívoco, ainda mais quando se trata da água.

Carlos Duarte, eu não te conheço. E pelo visto você também não me conhece (acho que já ouvi alguém dizer isso). O seu texto traz informações falsas, do tipo: Saudade foi eleita pelo PL (foi pelo PSB). Nunca utilizei esse discurso que é tão utilizado contra o Ciro em relação às suas filiações partidárias, acho que inclusive simplifica e descontextualiza muitas vezes discussões que deveriam ser menos rasas (mas é no mínimo irônico que como militante você tente utilizá-lo contra mim). Você diz: Nunca fizeram nada para quebrar o monopólio no transporte público no município. Espero que nesse caso seja desconhecimento sobre a realidade da luta que fizemos mandando projeto de quebra do monopólio pra câmara, em uma disputa que perdemos, mas que nos faz até hoje sermos reconhecidos como inimigos por parte dos empresários da cidade. Se eu fosse você, apagaria o artigo. Não conheço a sua biografia, mas ele mancha a história de qualquer pessoa que queira ser um militante de esquerda. Mas, erros acontecem. Quando vêm acompanhados de autocrítica, e correção de rumos, podemos avançar.

Baseado nisso, é que me dirijo a Cid pra dizer. Errou no voto? Errou. Me dirijo a Ciro e digo. Errou na abordagem? Errou. Me dirijo a você, Carlos, e digo. Errou ao mentir? Errou.

Mas podem tentar corrigir o erro se lutarem desde já contra a votação de outras propostas que ampliam a escalada de entrega dos recursos naturais para interesses privados. Dou como exemplo o projeto 495/2017 de Tasso Jereissati, que cria o “mercado de águas”. Não podemos permitir que seja aprovado.

Espero que reflitam e corrijam o rumo! ÁGUA NÃO É MERCADORIA!

Por Glauber Braga, deputado federal (PSOL-RJ)

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