A nuvem mudou

A nuvem mudou

Fotos: Charles Platiau/Reuters e Marcelo Camargo/Agência Brasil

“O político é um caçador de nuvens”
Ulysses Guimarães

A frase de Ulysses diz respeito aos cenários extremamente mutáveis da política. Se pensarmos no que aconteceu de maio de 2013 para cá, somos tentados a concluir que não dá para prever nada sobre o Brasil.

Mas não é bem assim.

Eu recomendo três textos meus – de antes, do começo e do meio do governo Bolsonaro – para ver que minha taxa de acerto para o cenário de um ano a frente foi relativamente alta.

E olhe que eu não sou um cientista político, eu sou um professor de filosofia da ciência que resolveu militar, sou filiado a um partido, não escondo meu lado. Posso até não expor coisas prejudiciais a meu candidato, mas não cultivo o hábito de mentir. Assim fica mais fácil errar pouco.

O cenário que há alguns meses mudava completamente com a reabilitação de Lula começa a dar outra reviravolta com o esfacelamento acelerado de Bolsonaro.

Os jornais paulistas pedem abertamente o impeachment do presidente. O desdobramento de pelo menos três linhas de investigação começa a erodir a imagem de honesto que ele ainda tem – Deus, e somente Deus sabe porque – com o núcleo duro de seu eleitorado. A maioria da população já quer o impeachment. Se esse ritmo se mantém mais um mês, o impeachment poderá será aberto.

A cada dia que passa Bolsonaro parece mais distante de estar na urna eletrônica em 2022.

Isso muda o jogo também para Lula.

O Lula triunfalista de dois meses atrás se transformou num Lula cuidadoso e cabreiro.

Esperto como é, já leu o cenário alterado adiante e deu sinais de estar preocupado com isso. Passou recibo ironizando a terceira via no momento em que Ciro mostra sinais de crescimento e se mostrou para colaboradores preocupado com o derretimento de Bolsonaro.

Hoje ele recebeu um recado do Estadão ao mesmo tempo que Bolsonaro. Só que o de Bolsonaro foi por editorial, o de Lula por Cantanhede. Ela pede que Lula tenha grandeza e se candidate a vice numa chapa de união nacional.

O que quer dizer isso? É que se antes o espantalho Lula servia para pressionar Bozo, agora que as elites paulistas resolveram cortar sua cabeça, Lula não tem mais serventia.
Ele é o próximo da lista.

As elites nacionais não extirparam o PT do poder ao custo em PIB e estabilidade que fizeram, para devolver em quatro anos.

Pesquisa RealTime BigData indica que o desejo número um em relação ao próximo presidente, com 85%, é “não ser processado por corrupção”. Por enquanto a população humilde acredita que Lula foi inocentado. Mas em breve os processos vão recomeçar.

2018 de novo? Nunca nada se repete. Mas tentam. Não há perspectiva de condenação judicial para Lula antes das eleições. Mas de desgaste sim. A espada será colocada de novo em sua cabeça.

Mas isso é o cenário lá na frente. É nuvem, pode mudar. Só que todos estão olhando para as nuvens do horizonte, o day after. Moro e o lavajatismo estão já se aquecendo para entrar em campo. Mourão para assumir o Bolsonarismo sem Bolsonaro. Dória conseguiu crescer dois pontos e dificilmente não será o candidato do liberalismo. Ciro se consolida com dois dígitos no mais adverso dos cenários.

Hoje, ainda é “todos contra Bolsonaro”.

Amanhã, será “todos contra Lula”.

Ele vai encarar?

É isso o que Cantanhede está perguntando.

É isso o que todos estão se perguntando.

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