A “visão industrial da indústria” e a imprecisão conveniente

Na Revolução Industrial Brasileira, projeto que iniciei em 2019 com meu amigo e parceiro Fernando Ferro, sempre pudemos contar com o significativo apoio do economista e professor Paulo Gala na gravação de conversas que, aos poucos, foram se tornando mais animadas, livres e interessantes.

Ao ponto de que começamos a bater uma bola na rede social que é mais propensa a debates sérios nos dias atuais, o Twitter. Pois foi ali que deu-se uma dessas altercações semi-intelectuais que a juventude contemporânea batiza apropriadamente de “treta”, tendo como centro um falacioso argumento comparativo entre a Coreia do Sul e o Brasil.

Usando uma base de dados feita por estudiosos da Universidade de Groningen, Holanda, economistas de convicção neoliberal empreenderam mais um ataque à posição industrialista (eles são assim: extrapolam conclusões a partir de teorias antigas sobre a divisão do trabalho e as vantagens comparativas entre nações para concluir apressadamente supostas verdades que não encontram eco na realidade atual do mundo).

Afirmaram, com aquele orgulho brilhoso de quem acha uma imprecisão que lhe convém, que se o Brasil tivesse a composição setorial da Coreia, não estaríamos desenvolvidos como a Coreia. Na prática, usaram o 10-Sector Database de Groningen e fizeram a operação aritmética de transplantação de dados.

A 10-Sector Database apresenta o retrato de dez setores econômicos (sempre os mesmos) em diferentes países. A ideia é promover comparações, mas ao agregar, por exemplo, “indústria”, a base deixa de captar desigualdades tecnológicas, estruturais, históricas, macroeconômicas e tantas outras entre “indústria do país A” e “indústria do país B”. Assim, fica fácil afirmar que se a indústria brasileira tivesse o mesmo nível de participação no PIB brasileiro que sua contraparte coreana tem no PIB daquele país, o Brasil não estaria rico/desenvolvido. Não estaria porque não se trata de apenas ganhar participação porcentual no PIB: trata-se de uma transformação da estrutura produtiva visando a ampliação de capacidades tecnológicas e criação permanente de inovações.

Então, depois de nos estapearmos digitalmente com os criadores de falácias convenientes, fizemos o vídeo abaixo, em que critico o que chamo de “visão industrial da indústria”, uma visão antiquada de que indústria é igual a fábrica. Essa é a visão que os adeptos do neoliberalismo gostam de usar para promover suas fatalidades anti-desenvolvimento e manter a sociedade brasileira às cegas a respeito de seu potencial de futuro.

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