Abstenção – Eleitores são de Marte, candidatos são de Vênus

A escalada na proporção de ausências em segundos turnos municipais é espantosa. Foram 16,2% em 2000, 17,3% em 2004, 18,09% em 2012 e 21,55% em 2016. Levantamento da Agência Senado, a partir de dados do TSE, mostra que a média é ultrapassada em alguns municípios importantes, como Rio de Janeiro (35,4%), Porto Alegre (32,8%) e São Paulo (30,8%).

O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, passou da conta ao opinar favoravelmente ao voto facultativo, quando analisou o elevado número de abstenções nas últimas eleições.

Mas se o argumento de Barroso embute alta dose de malandragem, ele toca um problema real: o fato de 29,5% do eleitorado brasileiro ter decidido ficar em casa. É um recorde histórico.

A escalada na proporção de ausências em segundos turnos municipais é espantosa. Foram 16,2% em 2000, 17,3% em 2004, 18,09% em 2012 e 21,55% em 2016.

Levantamento da Agência Senado, a partir de dados do TSE, mostra que a média é ultrapassada em alguns municípios importantes, como Rio de Janeiro (35,4%), Porto Alegre (32,8%) e São Paulo (30,8%).

A fatia atual expressa também os impactos da pandemia. Mesmo assim, é preciso perceber que o desinteresse revela um cansaço crescente do eleitorado com a política tradicional. Nada do que os candidatos pregam parece influir na vida concreta de um em cada três brasileiros com direito a voto.

A supressão de debates, a difusão de fake news, a percepção das eleições como perturbação da vida cotidiana, rescaldos da Lava Jato e ecos ainda perceptíveis do estelionato eleitoral de 2016 acabaram por desqualificar o voto como instrumento de participação e mudança social.

É verdade que o cenário irracional de 2018 mudou. Não temos mais – nas grandes capitais – aventureiros como Wilson Witzel ou Romeu Zema, figuras típicas da aversão à política. Despencou também o número de jagunços da política, a bizarra profusão de generais, coronéis e delegados a exibir patentes e fardas em horário nobre. Isso não quer dizer que candidaturas alucinadas não obtiveram êxito em municípios menores. Mas o fato das disputas com maior visibilidade nacional terem se dado entre postulantes que defendiam propostas mais ou menos racionais devolveu lógica política ao pleito.

No entanto, as abstenções mostram que a antipolítica – porta aberta para tentações autoritárias – ainda perdura. Do lado da oposição, valeria a pena examinar se e como o eleitorado recebe distintas propostas que deveriam incidir – e melhorar – a vida real de milhões de pessoas.

Por: Gilberto Maringoni.

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